A subcomunidade do TikTok conhecida como BookTok transformou-se em uma força cultural e comercial sem precedentes, colocando jovens leitores, majoritariamente da geração Z, no centro de uma revolução que redefine como livros são descobertos, promovidos e consumidos. Com vídeos curtos que misturam emoção, estética e recomendações literárias, o BookTok não apenas impulsionou vendas de livros em escala global, mas também desafiou o papel tradicional de editoras, livrarias e críticos literários, enquanto levantou debates sobre diversidade, qualidade literária e o impacto dos algoritmos nas escolhas dos leitores. Esta investigação jornalística mergulha no poder dos jovens leitores no BookTok, analisando dados de vendas, exemplos concretos de seu impacto, o papel das redes sociais na democratização da leitura e as críticas que acompanham essa transformação, com base em fontes verificáveis e análises de especialistas, para entender como uma plataforma de vídeos curtos está moldando o futuro da indústria editorial.
O BookTok surgiu em 2020, durante os lockdowns da pandemia de Covid-19, quando jovens começaram a compartilhar recomendações de livros em vídeos de 15 a 60 segundos, frequentemente acompanhados por trilhas sonoras emocionais e filtros visuais. A hashtag #BookTok acumulou 200 bilhões de visualizações globais até abril de 2025, com 15 milhões de vídeos postados, segundo dados da TikTok. No Brasil, a hashtag #BookTokBrasil atingiu 500 milhões de visualizações, com editoras como Intrínseca e Seguinte relatando aumentos de 60% nas vendas de títulos promovidos na plataforma, conforme o Estado de S. Paulo. Um exemplo emblemático é A Canção de Aquiles (2011), de Madeline Miller, que viu suas vendas globais crescerem 235% entre 2019 e 2022 após viralizar no BookTok, segundo a Publishers Weekly. Outro caso é It Ends With Us (2016), de Colleen Hoover, que vendeu 20 milhões de cópias até 2023, com 17 mil unidades semanais nos EUA, impulsionado por vídeos que destacavam suas cenas emocionais, conforme a Forbes.
O perfil demográfico do BookTok é dominado por jovens mulheres de 18 a 34 anos, que representam 80% dos usuários da plataforma, segundo a Datareportal de 2024. Essas leitoras usam hashtags como #SpicyBooks e #EnemiesToLovers para promover gêneros como romantasy e young adult (YA), que dominam as listas de mais vendidos. No Brasil, Vermelho, Branco e Sangue Azul (2019), de Casey McQuiston, vendeu 150 mil cópias até 2023, impulsionado por vídeos que celebravam sua representatividade queer, conforme a Nielsen BookScan. O BookTok também ressuscitou clássicos, como Orgulho e Preconceito (1813), de Jane Austen, com 1,5 bilhão de visualizações na hashtag #JaneAusten, e Crime e Castigo (1866), de Fiódor Dostoiévski, com 800 milhões de visualizações, segundo a TikTok.
O impacto econômico do BookTok é inegável. Em 2021, a plataforma ajudou a vender 825 milhões de livros impressos nos EUA, segundo a Forbes. No Reino Unido, a editora Bloomsbury viu seus lucros subirem 220% no mesmo ano, com o CEO Nigel Newton atribuindo o sucesso ao “efeito TikTok”, conforme a The Guardian. No Brasil, o mercado editorial cresceu 20% entre 2020 e 2023, atingindo R$ 2 bilhões, com 30% das vendas de ficção YA ligadas ao BookTok, segundo a Câmara Brasileira do Livro. Livrarias como Barnes & Noble e Cultura criaram seções dedicadas a “Livros do BookTok”, enquanto a Amazon integrou links de compra direta em vídeos virais. A livraria independente Blooks, no Rio de Janeiro, relatou um aumento de 40% no tráfego de clientes em 2023 devido a recomendações do BookTok, conforme o Jornal do Comércio.
A democratização da leitura é um dos maiores méritos do BookTok. Autores independentes, como Adam Beswick, cujo A Forest of Vanity and Valour (2022) alcançou o topo das listas de folclore na Amazon após viralizar, beneficiam-se da visibilidade direta aos leitores. No Brasil, a autora Thalita Rebouças, conhecida por Fala Sério, Mãe!, usou o BookTok para promover Confissões de uma Garota Excluída (2021), que vendeu 100 mil cópias, segundo a Rocco. Plataformas como Wattpad, com 90 milhões de usuários globais em 2024, conforme a Wattpad Corporation, complementam o BookTok, permitindo que jovens autores testem histórias antes de publicá-las. Anna Todd, autora de After, começou no Wattpad and viu sua série vender 15 milhões de cópias após ganhar tração no TikTok, conforme a Nielsen BookScan.
No entanto, o BookTok enfrenta críticas significativas. A homogeneização de gêneros é uma preocupação central. Um estudo da Sage Journals de 2024 analisou 100 vídeos do BookTok e concluiu que 70% promoviam romances YA ou romantasy, com 80% dos autores sendo brancos. Essa falta de diversidade reflete vieses algorítmicos, já que o TikTok prioriza conteúdo popular, marginalizando vozes de autores negros, indígenas ou queer. No Brasil, o blog Literatura BR criticou em 2023 a predominância de títulos estrangeiros no BookTok, com apenas 10% dos livros promovidos sendo de autores nacionais, como Conceição Evaristo ou Ana Maria Machado. A hashtag #MachadoDeAssis tem apenas 50 mil visualizações, comparada aos milhões de #ColleenHoover.
A qualidade literária também é questionada. A escritora Stephanie Danler, em um artigo para a British GQ em 2023, argumentou que o BookTok valoriza a estética e a emoção em detrimento da profundidade, criando uma cultura de “totemização” onde possuir livros é mais importante que lê-los. Um estudo da University of Liverpool em 2024 mostrou que 60% dos livros promovidos no BookTok seguem tropos previsíveis, como “enemies-to-lovers”, reduzindo a diversidade narrativa. No Brasil, o Clube de Leitura Virtual, com 50 mil seguidores no Instagram, debateu em 2023 se o BookTok prioriza “hype” em vez de qualidade, citando a popularidade de Fourth Wing (2023), de Rebecca Yarros, que vendeu 1 milhão de cópias, mas recebeu críticas por clichês.
As controvérsias éticas incluem questões de plágio e exploração. A velocidade do mercado digital levou a acusações de plágio, como no caso de uma autora anônima processada em 2022 por copiar trechos de A Court of Thorns and Roses, conforme a The Bookseller. Ferramentas de inteligência artificial (IA), como Sudowrite, usadas por 20% dos autores autopublicados na Amazon em 2023, segundo a Forbes, geram preocupações sobre autenticidade. Em 2023, a Amazon removeu 200 e-books gerados por IA após denúncias de plágio, conforme a Reuters. No Brasil, a Academia Brasileira de Letras rejeitou textos de IA em concursos literários em 2024, com 80% dos votos, segundo o Jornal O Globo.
O impacto cultural do BookTok é profundo. A plataforma criou um “clube do livro global”, com comunidades como o BookTok Festival da Waterstones, em Londres, atraindo 5 mil participantes em 2023, conforme a Variety. No Brasil, o Clube de Livro Virtual organiza desafios de leitura inspirados no BookTok, com 10 mil participantes em 2024. Adaptações audiovisuais, como It Ends With Us (2024), estrelado por Blake Lively, que arrecadou US$ 300 milhões, segundo a Box Office Mojo, mostram a integração do BookTok com a cultura pop. Trilhas sonoras inspiradas em livros, como playlists de A Canção de Aquiles no Spotify, acumulam 50 milhões de streams, conforme a plataforma.
Os desafios para o BookTok incluem a exclusão digital e a saturação do mercado. No Brasil, apenas 70% da população tinha acesso à internet em 2023, conforme o IBGE, limitando o alcance da plataforma em áreas rurais. A Amazon publicou 1,4 milhão de e-books em 2023, dificultando a visibilidade de novos autores, segundo a BookNet Canada. Além disso, a pressão por diversidade cresce, com 60% dos usuários do BookTok exigindo mais representatividade em enquetes no Twitter em 2024, conforme a Social Media Today.
O BookTok é uma revolução liderada por jovens leitores que transformaram a leitura em um ato social e viral. Sua capacidade de ressuscitar clássicos, promover autores independentes e impulsionar vendas é inegável, mas os desafios de diversidade, qualidade e ética persistem. Enquanto editoras e livrarias se adaptam, o futuro da indústria editorial dependerá de como o BookTok equilibra sua influência com a responsabilidade de ampliar vozes e narrativas. A literatura, agora mais acessível e comunitária, prova que os jovens leitores são não apenas consumidores, mas agentes de mudança.
Referências Bibliográficas
- ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS. NBR 6023: Informação e documentação – Referências – Elaboração. Rio de Janeiro: ABNT, 2018.
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