APRESENTAÇÃO
Vento de queimada conta a história de Isabel, historiadora por formação e matadora por deformação. Seu pai, um ex-policial pistoleiro ― ou um pistoleiro ex-policial, já que não há como saber o que veio primeiro ―, trabalha para figuras poderosas e influentes no estado de Goiás. A relação dos dois, assim como suas práticas e seus hábitos, não é estruturada de maneira convencional ― neste vínculo, não se sabe quem é responsável por quem, quem deve ser exemplo para quem. O pai, por ser quem é e por fazer o que faz, de tempos em tempos expõe a filha a incidentes que não lhe dizem respeito, inserindo-a num trágico ambiente de ganância e violência. Estamos nos estertores da ditadura militar, no coração da república, e Isabel se vê cercada por “homens de bem” dos mais diversos tipos. E, às vezes, em ambientes assim, só é possível alcançar a saída atirando.
Autor de romances excepcionais, como Eufrates e Hoje está um dia morto (vencedor do Prêmio SESC de Literatura), André de Leones traz em Vento de queimada um retrato de um país composto por beleza, mas também por horror. Descrito por Luisa Geisler, que assina o texto de orelha, como um “Taratino tropical”, o livro é um convite, um chamamento, que vale a pena ouvir e atender.
RESENHA
André de Leones, em seu livro “Vento de Queimada”, convida o leitor a explorar aspectos pouco conhecidos do Brasil dos anos 1980. O romance se desenrola em meio à violência em Goiânia, Brasília, interior de Goiás, São Paulo e outras cidades, possuindo como protagonista Isabel. Nesse período, encontramo-nos nos momentos finais da ditadura, enquanto diversos tipos de criminosos circulam pelos bastidores da cena política nacional. O livro aborda o custo-Brasil, onde cadáveres se acumulam e, às vezes, a única forma de encontrar uma saída é através da violência. É uma narrativa amoral que retrata seres imorais.
Um romance passado na região Centro-Oeste do Brasil, explorando cidades como Brasília, Goiânia e outras menos conhecidas, como Silvânia, Minaçu e Vianópolis. Esses locais, geralmente ausentes na literatura nacional, nos levam a refletir sobre como o Brasil é verdadeiramente um mosaico de países estrangeiros. A história se desenrola em 1983, durante o governo de João Figueiredo (1979 – 85), marcando o fim do longo período de governos militares. Nenhum dos personagens é inocente, seja como assassinos contratados, políticos corruptos ou simplesmente criminosos. Todos eles causam dor e sofrimento em suas vítimas, buscando lucro máximo e tentando sobreviver.
Na trama, Isabel é a protagonista que, com seu pai William Garcia, um ex-policial, atua como matadora de aluguel. William possui uma tatuagem nas costas com a ilustração invertida de “Behemoth e Leviatã”, de William Blake. A dupla trabalha para figuras poderosas e influentes no estado de Goiás, intermediados por Gordon, um estrangeiro, com acesso livre a políticos e empresários brasileiros. Além disso, ele mantém um relacionamento amoroso intenso com Isabel em seus momentos livres. Ao longo da história, os detalhes da peculiar dupla de assassinos, pai e filha, são revelados gradualmente, incluindo os eventos que levaram Isabel a abandonar sua carreira como historiadora. Como ela costuma dizer, “a vida no circo não é fácil”.
“Vento de Queimada” é um roteiro de faroeste brasileiro que utiliza a estrutura dos capítulos como referência às obras de Xenofontes, um historiador e filósofo ateniense que foi discípulo de Sócrates. Os capítulos são intitulados Anábase, Catábase e Parábase, seguindo essa inspiração. Além disso, o texto também faz referências literárias e históricas, especialmente nos diálogos bem-humorados entre Isabel e Gordon. André de Leones, o autor, demonstra um domínio completo das técnicas narrativas, criando um romance criativo e envolvente, recomendado para quem busca entretenimento e reflexão ao mesmo tempo.
Um romance arrebatador que cativará gerações por sua genialidade.
O AUTOR
André de Leones (Goiânia, 1980) é autor dos romances: Vento de queimada (Record, 2023), Eufrates (José Olympio, 2018), Abaixo do paraíso (Rocco, 2016), Terra de casas vazias (Rocco, 2013), Dentes negros (Rocco, 2011), Como desaparecer completamente (Rocco, 2010) e Hoje está um dia morto (Record, 2006), a coletânea de contos Paz na Terra entre os monstros (Record, 2008) e o livro infantojuvenil Daniel está viajando (Quase Oito, 2019). Vive atualmente em São Paulo.