Primeiro best-seller de Erico Verissimo, Olhai os lírios do campo representou uma guinada na carreira literária do escritor. Várias edições se esgotaram em poucos meses. Segundo Erico, o sucesso foi tão grande que "teve a força de arrastar consigo os romances" que publicara antes em modestas tiragens.
Temporalmente, o texto escrito por Érico Veríssimo, em 1938, pode ser associado ao tempos mais remotos até os dias atuais.]Análogo ao contexto descrito no Sermão da Montanha, quando Jesus Cristo ensina aos fariseus sobre o excesso de preocupação com a aparência e o acúmulo de riquezas, o texto inspira o autor a iniciar uma discussão sobre o pensamento capitalista vivido no Brasil, na década de 1930, onde o acúmulo de capital, a ostentação e a supervalorização da posição social se sobrepõem aos conceitos de moral, respeito ao próximo e até mesmo às famílias. O romance modernista típico da semana de 1922, da obra de Érico Veríssimo abrange as primeiras décadas do século XX, então permeadas por mudanças de ordem estrutural, política, social e ideológica. Seu viés político-social contrasta com o clima bucólico vivido pelo personagem principal, Eugênio, um jovem médico que vive em conflito sobre suas concepções sobre amor e ascensão social. O Brasil recém havia passado pelo golpe de estado que deu origem à República e, menos de meio século após o evento, a estrutura é dissolvida pela Revolução de 30, seguida pelo golpe que instituiu o Estado Novo, menos de uma década depois. Na adesão à economia capitalista, o Brasil se vê em meio a contradições: a industrialização que convive com a tradição rural do país, as acentuadas diferenças entre campo e cidade, os dilemas sociais enfrentados pela população com a crescente modernização da sociedade. A maior parte da produção literária do período provém do nordeste e do sudeste. No Sul o principal expoente será Érico Veríssimo, que, em suas obras, irá abordar os problemas da classe média urbana, onde os cidadãos são confrontados com a vida na cidade grande em rápida transformação. No período analisado, qual seja ele a década de 1930, algumas cidades do Brasil passavam por um intenso processo de modernização, com a implementação da indústria e os projetos de urbanização. Neste caso específico, os processos identificados privilegiam o Rio Grande do Sul e, mais especificamente, Porto Alegre. O ideal de progresso é o respaldo para a legitimação da corrente positivista que viera agregada à república, além da implementação do liberalismo econômico, que prega a livre concorrência. A incipiente industrialização promove a consolidação da classe dos operários, trabalhadores das fábricas e da construção civil. As condições de trabalho eram precárias em todos os estados, o que causava inúmeras revoltas urbanas das classes trabalhadoras. Assim, o governo implementa uma série de medidas que visa ao tratamento específico das questões trabalhistas, já que havia abuso nas relações entre os proletários e a burguesia industrial que os empregava. Com a industrialização e a consolidação das classes operárias e burguesas, as relações capitalistas se intensificam. A modernização do estado está fortemente ligada às políticas públicas de urbanismo das cidades, onde o centro acomoda os signos modernos – edifícios, calçadas, luz elétrica, lojas, automóveis – enquanto que os bairros afastados servem para manter a população mais pobre e os operários à margem desse desenvolvimento. O romance presentemente analisado está permeado por críticas relativas à sociedade do período e cobrem diversos assuntos, desde o posicionamento político até a conduta dos personagens, passando pela crítica à moral e aos bons costumes, além de proporcionar um painel histórico e social a partir de uma visão peculiar, que é a de Érico Veríssimo. É importante observar que o casamento de Eugênio com Eunice tivera o aspecto de uma transação comercial. Em todo momento fica claro que não há amor naquela união e que tudo não passa de um jogo de interesses. Eugênio, como dito anteriormente, sente-se deslocado do meio em que está e seu dilema é pautado pela procura por um ambiente confortável.
Esse seu sentimento de não pertencimento ao meio pode ser interpretado como uma metáfora ao cidadão médio brasileiro residente no meio urbano, e que percebe, de repente, uma sociedade diversa daquela em que sua identidade fora construída. A situação do operariado no Brasil naquele momento também é tratada na trama. A questão é evidenciada tanto no ambiente fabril, na primeira parte, quanto no consultório de Eugênio na segunda. É importante observar que o casamento de Eugênio com Eunice tivera o aspecto de uma transação comercial. Em todo momento fica claro que não há amor naquela união e que tudo não passa de um jogo de interesses. Eugênio, como dito anteriormente, sente-se deslocado do meio em que está e seu dilema é pautado pela procura por um ambiente confortável. Esse seu sentimento de não pertencimento ao meio pode ser interpretado como uma metáfora ao cidadão médio brasileiro residente no meio urbano, e que percebe, de repente, uma sociedade diversa daquela em que sua identidade fora construída. Temos, desta forma, um panorama do estado de coisas na Porto Alegre do contexto: a convivência da sociedade com os signos da modernidade, que se sobrepõem à sua tradição quando novas construções são feitas em cima dos velhos casarões coloniais; os problemas enfrentados pela população, com sua carência em relação à saúde e educação; as necessidades de consumo como forma de pertencimento a um conjunto, o que vai influenciar na economia; a busca por lucro a qualquer custo por parte da burguesia, criando tensões entre as classes; as péssimas condições de trabalho dos operários, expostos a todo tipo de risco. Além do panorama histórico, Veríssimo imprimiu seu ponto de vista crítico por meio das situações sociais que criou: filhos fora do casamento, matrimônio por conveniência, aborto criminoso, a prática médica irresponsável, a responsabilidade social, o preconceito racial por meio do drama de um judeu, o adultério e a mulher em busca do mercado de trabalho. Nos dias atuais, podemos observar ainda a persistência de certas práticas burguesas presentes na época em que esse romance foi escrito, e até mesmo nas relações trabalhistas, evidenciado pelos constantes movimentos sociais por melhores condições de trabalho e de vida.
A desigualdade social que ainda predomina no Brasil, já foi retratada por Veríssimo ao citar as dificuldades vividas pela família de Eugênio para oferecer a ele condições de estudo visando um futuro diferente daquela realidade que os atinge. Apesar de notarmos nos dias atuais uma melhora no acesso à educação e consequentemente uma maior possibilidade de crescimento, ainda é bastante palpável a desigualdade que alimenta a pobreza e favorece os conflitos sociais.
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