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Resenha: Ubirajara, de José de Alencar

ISBN-13: 9788572328999
ISBN-10: 8572328998
Ano: 2013 / Páginas: 136
Idioma: português
EditoraMartin Claret

O jovem caçador araguaia, Jaguarê, procura em terras alheias um inimigo para desafiar e combater. Levando um prisioneiro para sua taba ele conseguirá seu título de guerreiro. Ao contrário do que esperava, encontra uma índia tocantim, filha do chefe, de nome Araci. Ela diz que em sua nação há cem guerreiros que vão disputar seu amor. Jaguarê é convidado a alistar-se entre eles, mas prefere dizer à virgem que mande todos seus pretendentes para combatê-lo. Após a partida de Araci, aparece um índio tocantim, Pojucã, que aceita o desafio de Jaguarê. O índio araguaia vence e aprisiona o guerreiro tocantim com sua lança, intitulando-se a partir de então, Ubirajara, o senhor da lança. Ubirajara deixa o prisioneiro em sua taba, dando-lhe como esposa do túmulo a jovem Jandira, que até aquele instante era sua noiva. Em seguida, parte o guerreiro para a nação dos tocantins. Jandira não aceita ser esposa de outro que não Ubirajara e foge para a floresta. Ubirajara chega à taba de Araci e, como a lei da hospitalidade permite, não se identifica, adotando o nome de Jurandir, o que veio trazido pela luz. Compete com os demais e ganha o direito de casar-se com Araci, mas antes da noite nupcial é obrigado a identificar-se. Cria-se uma situação constrangedora, pois seu prisioneiro é irmão de Araci. Declara-se a guerra. Ubirajara liberta Pojucã para que possa lutar ao lado de seu povo. Quando os araguaias vão atacar, surgem os tapuias que, por justiça, têm o direito de guerrear antes dos araguaias, que devem esperar. O chefe dos tocantins, Itaquê, vence o chefe tapuia, mas fica cego, não podendo liderar seu povo. Para sucedê-lo, os guerreiros devem dobrar seu arco e atirar como ele. Como os guerreiros de seu próprio povo não conseguem, convidam Ubirajara a fazê-lo. O guerreiro araguaia, genro de Itaquê, consegue com tal destreza e força que emociona o velho Itaquê. Assim, Ubirajara une os dois arcos e as duas nações, araguaia e tocantim, dando origem à grande nação ubirajara. Como prêmio, ganha também duas esposas: Araci e Jandira.

RESENHA 

Ubirajara, o Senhor da Lança

Jaguarê é um jovem índio da tribo araguaia, filho de Camacã, líder supremo. Apesar de sua fama como exímio caçador, o rapaz deseja realizar uma façanha de guerra e assim receber um nome de guerreiro e galgar melhores posições junto ao seu povo.

Mas o que antes era uma busca por realização pessoal torna-se uma épica jornada de amor e superação, quando Jaguarê se encontra por acaso com Araci, bela filha do chefe dos tocantins. Apesar do interesse mútuo, os jovens são de tribos rivais e Jaguarê sequer tem a posição social necessária para disputar o amor de Araci.

A oportunidade surge então para o rapaz quando, pouco depois de se despedir de Araci, Jaguarê encontra Pojucã, campeão dos tocantins. Numa luta equilibrada, Jaguarê acaba perdendo sua lança para o adversário, que não imaginava que a arma obedecia apenas a seu mestre. A lança se volta contra Pojucã, que acaba derrotado. Assim Jaguarê, por ter vencido o mais forte guerreiro dos tocantins, assume o nome de Ubirajara, o senhor da lança.

Escrito por José de Alencar e publicado em 1874, esse romance indianista apresenta um texto composto de frases e parágrafos curtos, com verbos em geral no tempo presente, o que garante ao texto certo dinamismo. Alencar procura valorizar um vocabulário indígena, o que pode muitas vezes soar estranho e artificial.

Ao contrário de muitos romances de Alencar, "Ubirajara" procura explorar as cenas de ação sem deixar de fora o sangue e a violência. Um dos combates em especial nos faz lembrar das lutas de imobilização nos hoje famosos torneios de MMA.

"Os dois campeões recuaram passo a passo até que se acharam a um tiro de arco.
Então soltaram o grito de guerra e se arremessaram um contra o outro brandindo o tacape.
Os tacapes toparam no ar e os dois guerreiros rodaram como as torrentes impetuosas no remoinho da Itaoca.
Dez vezes as clavas bateram, e dez vezes volveram para bater de novo.
Os animais que passavam na floresta fugiram espavoridos, como se a borrasca ribombasse no céu.
Ainda uma vez encontraram-se os dois tacapes e voaram em lascas pelos ares.
— O ubiratã é forte; mas há outro ubiratã que lhe resiste. Como o braço de Pojucã é que não há outro braço. Já viste, jovem caçador, o veado nas garras da jibóia? Assim vais morrer.
— Se tu fosses a cascavel que somente sabe morder, Jaguarê te esmagaria a cabeça com o pé e seguiria seu caminho. Mas tu s a jibóia feroz; e Jaguarê gosta de estrangular a jibóia. Não morrerás pelo pé, mas pela mão do caçador. Lança teu bote, guerreiro tocantim.
Pojucã estendeu os braços e estreitou os rins de Jaguarê, que por sua vez cingiu os lombos do guerreiro.
Cada um dos campeões pôs na luta todas as suas forças, bastantes para arrancar o tronco mais robusto da mata.
Ambos, porém, ficaram imóveis. Eram dois jatobás que nasceram juntos e entrelaçaram os galhos ligando-se no mesmo tronco."

O trecho acima ilustra um dos muitos momentos em que a ação recebe grande destaque no enredo.

É importante observar que Alencar, normalmente tão descritivo, acaba sendo sucinto demais em suas descrições. Acredito que isso rouba um pouco a força do romance.

Outro aspecto que deve ser destacado é o uso dos nomes próprios pelos personagens e como o próprio herói muda de nome ao longo da aventura. Jaguarê, após se tornar Ubirajara, dias depois adota o nome de Jurandir, que usará enquanto disputar o amor de Araci.

A despeito dos preconceitos presentes na obra, vale lembrar que existia sim um projeto indianista de valorização nacional. Não cabe aqui a discussão ou defesa desse projeto. Aponto somente que a literatura também cria os seus mitos e tradições, que vão além das lendas orais. Vale destacar assim textos como O Hobbit e O Senhor dos Anéis, tão em voga ultimamente.

Em que Ubirajara se aproxima dessas narrativas épicas? Primeiramente, na posição do herói. Guardadas as devidas proporções, o protagonista do romance de Alencar, assim como os personagens dos livros de J.R.R. Tolkien, enfrenta uma série de desafios, todos ligados a jornadas. O herói está em trânsito constante, símbolo das mudanças a que todo protagonista está submetido. Essas mudanças marcarão o crescimento desse herói. No caso do protagonista do romance indianista, essa mudança também está marcada nos diferentes nomes que o herói assume ao longo de sua jornada.

Da mesma forma que no livro O Hobbit, há em Ubirajara um desafio a ser alcançado. No romance britânico, o desafio é encontrar o tesouro e enfrentar o maligno dragão Smaug. E a busca desse objetivo acaba por desencadear uma terrível guerra. Em Ubirajara, o tesouro é o amor da jovem Araci, filha do chefe supremo dos tocantins. Os acontecimentos que envolvem a disputa pela jovem lançam também Ubirajara em um aguerra que irá selar o destino das tribos.

Por esses e outros motivos, Ubirajara pode apresentar-se ao leitor como uma agradável surpresa. No que se espera uma leitura enfadonha, arcaica, a grande surpresa poderá se apresentar na descoberta de um texto dinâmico e ágil, repleto de romance e aventuras.

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