O décimo livro da série francesa, escrito por Émile Zola em 1886, foi publicado em partes no periódico Gil Blas no mesmo ano. A obra foi traduzida para o inglês por Ernest A. Vizetelly, mas quando foi publicada pela Barnes & Noble em 2006, tinha visto apenas algumas edições e traduções em todo o mundo. Os críticos consideraram a tradução extremamente intelectual, tornando a obra menos acessível em comparação com a edição de 1957 publicada por Thomas Walton. Agora a obra terá nova tradução para o português pela Unesco, que busca publicar os grandes clássicos mundiais.
É essencial compreender a mensagem que Zola tentou transmitir ao escrever este livro. Seu objetivo era mostrar a importância dos traços herdados em nossas vidas.
A história gira em torno de um homem que perdeu a mãe quando criança, casou-se com Christine, enfrentou a pobreza, presenciou o fracasso de perto e cometeu um ato impensado devido ao seu medo e insegurança. Ao longo do livro, conhecemos personagens de outras obras de Zola, o que torna a leitura ainda mais agradável para os fãs da autora.
Zola e Cézanne eram amigos desde a infância em Aix-en-Provence, cidade que serviu de inspiração para Plassans na obra de Zola. O protagonista Claude Lantier, cujo autor é Zola, é baseado em artistas revolucionários, entre eles Cézanne, incompreendidos pela sociedade da época. Monet, Manet e Cézanne foram alguns dos artistas que influenciaram os traços de caráter de Claude. Além disso, Pierre Sandoz é um personagem fictício baseado em Zola.
O romance se passa no século XIX e aborda o mundo boêmio da arte parisiense. Ele também examina o surgimento do realismo, do naturalismo e do impressionismo na pintura. Zola enfatiza a escultura, a literatura, a arquitetura, a música e o jornalismo do período, bem como a comercialização da arte. Retrata a vida artística de Paris com base em personagens reais, como artistas, escritores, negociantes de arte e amigos pessoais.
O título do livro “A Obra” refere-se aos esforços do personagem principal Claude Lantier para pintar uma grande obra que refletisse seu talento e genialidade.
Considero essa fase uma das mais fortes: a escrita é forte, com imagens terríveis sem esconder nada, inclusive as coisas mais tristes. É Zola no seu melhor, um romance que desperta emoções e nos deixa com uma ansiedade constante. É incrivelmente bem escrito, mas é brutal e trágico (sabemos desde o início que o final será ruim, as teorias pseudomédicas em que se baseia o ciclo do romance não deixam dúvidas).
Claude Lantier é essencialmente um artista. Enquanto caminha com a esposa, ele vê o mundo como uma tela pronta para ser pintada. Zola descreve tudo de forma impressionante usando luz, sombras e cores, como se fossem obras de arte. Desde o primeiro capítulo ele nos apresenta uma Paris quase misteriosa iluminada por uma tempestade. O realismo desaparece diante da visão do criador e transforma o mundo numa obra de arte.
Claude é um personagem que prefere a arte à realidade. Sandoz, amigo escritor de Zola, observa que no passado a natureza era mais bela que a pintura, mas agora muitas pinturas a superam. O grande desafio é retratar a realidade com a maior precisão possível. Claude quer ir além do que a natureza oferece e cria símbolos que tornam uma obra de arte incompreensível.
Claude deixa suas emoções e desejos fluírem para a tela. Suas pinturas são uma expressão direta de seus sentimentos. No entanto, a arte às vezes substitui a realidade. Claude admite que prefere a imagem de Christine à dela. Zola usa uma linguagem sensual ao falar sobre as mulheres retratadas por Claude. Ele explica que seus relacionamentos com as mulheres na vida real são complicados e que ele não se sente atraído por elas. Christine gradualmente começa a ver a pintura como uma rival e desenvolve ciúme.
No entanto, a arte se torna uma obsessão louca para Claude. Os capítulos finais são sombrios: o pintor perde o controle da realidade, é atormentado pela tela em que trabalhou durante anos e se transforma em um fantasma possuído pela pintura. Ele acredita ter ouvido uma mulher meio pintada chamando por ele. Chega assim ao ápice da loucura: tudo é sacrificado em nome da arte, em nome da imagem que é sinônimo de loucura.
A obra se constrói como um jogo de espelhos: o segundo capítulo encontra o décimo primeiro e penúltimo. Ambos mostram jantar com amigos de infância. Na primeira cena, eles são amigos de verdade, compartilhando preocupações, visões de arte e uma infância comum. Na segunda cena, eles se separam, negando o passado, alimentando-se do ódio um do outro, irritados por não terem alcançado seus objetivos, por não terem feito suas grandes obras, por não terem lutado por seu lugar no mundo . O fracasso é uma experiência partilhada por todos, mas apenas Sandoz e Claude continuam amigos.
Essa cena trágica faz parte de um desfecho marcado pelo espectro da morte que permeia quase toda a última parte do livro. Outros exemplos incluem a morte de um filho, a morte de dois personagens principais, a morte da amizade, a morte das ambições artísticas e dos sonhos de grandeza, a morte da paixão criativa. Até o destino da pintura de Claude é pior que o do Salon des Refusés no início do romance: já havia sido visto, comentado, mas no final foi como se não existisse mais, nem mesmo seus amigos pudessem encontrar isto.
É uma leitura sensível que requer atenção. É um clássico que nos transporta para o mundo da arte e nos faz pensar nas experiências e desafios que os artistas enfrentam.
O AUTOR
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