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[RESENHA #567] Esquecer para lembrar, de Carlos Drummond de Andrade

APRESENTAÇÃO

Segundo volume da reunião de poemas memorialísticos de Drummond, Boitempo II: Esquecer para lembrar retorna em novo projeto, com posfácio de Heloisa Murgel Starling.

Em Boitempo II, Drummond se afasta da infância rural e ingressa em um mundo novo, o da tecnização forçada, onde só importa o que cada um produz ou comercializa: chapéu, gaiola, punhal, geleia, pão de queijo, caixão. O menino de Itabira, porém, nada fabrica: apenas assiste às fabricações.

É desse ponto de vista, de observador desconfi­ado, que vemos o progresso en­fim chegar ao Brasil do interior, impondo suas multas e restrições: é proibido galopar pelas ruas de pedra, estender roupa branca entre os túmulos do cemitério, rezar alto de madrugada. Mas, então, pergunta-se o futuro poeta: “Que fazer, para não morrer de paz?”

Carlos é mandado à escola, deixa a casa paterna, aventura-se no trem de ferro, estuda latim e gramática, destaca-se nos panfletos estudantis, ganha o apelido de Anarquista. Os padres o expulsam do colégio, acusando-o de “insubordinação mental”. Rejeitado, o adolescente perde a fé. Decide deixar de ser “santo” para tornar-se “barro e palavrão, / humana falha, signo terrestre”.

Cavalgando o tempo — “uma cadeira ao sol, e nada mais” —, o poeta cresce. De repente se vê moço e solto em Belo Horizonte. Bancado pela família, frequenta a vida literária, entre os modernistas do Café Estrela e da Livraria Alves. Forma-se em Farmácia, mas “apenas na moldura”.

Vadia, namora e dorme. Ouve o chamado da escrita e do serviço público, torna-se redator de jornal, escreve para o Partido Republicano Mineiro, mas algo o incomoda. É a “consciência suja”, o remorso de ser um “inconvicto escriba ofi­cial”. Ele ainda cultiva em si o menino Carlos, o do segundo ginasial, que sonhava “emitir clarões / de astro-rei literário”. Não demoraria a acontecer. Era só uma questão de tempo.

As novas edições da obra de Carlos Drummond de Andrade têm seus textos fixados por especialistas, com acesso inédito ao acervo de exemplares anotados e manuscritos que ele deixou. Em Boitempo II, o leitor encontrará o posfácio da historiadora Heloisa Murgel Starling; bibliografias selecionadas de e sobre Drummond; e a seção intitulada “Na época do lançamento”, uma cronologia dos três anos imediatamente anteriores e posteriores à primeira publicação do livro.

Bibliografias completas, uma cronologia de vida e obra do poeta e as variantes no processo de fixação dos textos encontram-se disponíveis por meio do código QR localizado na quarta capa deste volume.

Um poema curto e intrigante presente na obra é pavão (p.158):

PAVÃO 

A caminho do refeitório, admiramos pela vidraça

o leque vertical do pavão 

com toda a sua pompa 

solitária no jardim. 

De que vale esse luxo, se está preso 

entre dois blocos do edifício? 

O pavão é, como nós, interno do colégio.

O autor utiliza a figura do pavão para analisar o símbolo da vaidade humana, onde estamos presos à estereótipos ligados à imagem e os efeitos nocivos da beleza no ser humano, ao passo de que se segue, o autor analisa de forma profunda com uma crítica ao universo social e nossa relação com os preconceitos aos quais estamos arraigados, uma crítica social positivista acerca da concretização da beleza.

Em síntese, a obra é profunda em toda sua vertente e ao qual se propõe, sendo uma belíssima homenagem póstuma ao autor. Perfeito para amantes de poesias, poemas, crônicas, filosofia e literatura nacional.

RESENHA

Boitempo II: esquecer para lembrar, segundo volume de seus poemas memorialísticos, Drummond se afasta da infância rural e ingressa em um mundo novo, o da tecnização forçada, onde só importa o que cada um produz ou comercializa: chapéu, gaiola, pão de queijo, caixão. O menino de Itabira, porém, nada fabrica: apenas assiste às fabricações. Nesta edição, o leitor encontrará o posfácio da historiadora Heloisa Murgel Starling.

Este livro é o segundo volume de poesia de Carlos Drummond de Andrade e faz parte da grande homenagem que o poeta mineiro iniciou em 1968 com a publicação de Boitempo. Apesar da aparente simplicidade dos poemas, há uma profunda reflexão sobre as memórias do autor. Quando se trata de Itabira, Drummond lembra-se mais do seu passado, destacando-o como legado da escravidão em Minas Gerais e no Brasil. Ao descrever sua passagem pelo Colégio Friburgo, ele também reflete sobre sua relação com a religião. Seus anos de "juventude livre" falam tanto dos avanços quanto das limitações encontradas em Belo Horizonte: "Aqui ninguém bate palmas", observa o poeta entre surpresa e decepção.

Os poemas exploram as complexidades da vida cotidiana através das lentes críticas do escritor - fornecendo uma descrição realista dos desafios emocionais enfrentados pelos personagens nas situações mundanas do dia-a-dia. As crônicas incluídas no livro também refletem a perspicácia aguçada de Drummond sobre o mundo ao seu redor. Ele escreve com delicadeza sobre momentos triviais que muitas vezes passam despercebidos pela maioria das pessoas - mostrando-nos como até mesmo as pequenas coisas podem ser profundamente significativas quando vistas sob a luz certa da sensibilidade literária.De maneira geral, "Esquecer para Lembrar" é um livro belo e inspirador que nos leva numa jornada íntima rumo aos sentimentos humanos universais. Através desses textos sutis somos convidados pelo poeta mineiro a refletir sobre nossas próprias vidas e experiências pessoais - lembrando-nos sempre que os momentos mais simples muitas vezes guardam as maiores riquezas existenciais.


O AUTOR

Carlos Drummond de Andrade (1902–1987) foi um dos maiores poetas brasileiros do século XX. "No meio do caminho tinha uma pedra / tinha uma pedra no meio do caminho" é um trecho de um de seus poemas mais conhecidos.

Drummond foi também cronista e contista, mas foi na poesia que mais se destacou. Foi o poeta que melhor representou o espírito da Segunda Geração Modernista com uma poesia de questionamento em torno da existência humana.

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