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[RESENHA #715] O idiota, de Dostoiévski


Nova edição, revista pelo tradutor, de O idiota, um dos grandes romances de Dostoiévski, trazendo a série completa de ilustrações de Oswaldo Goeldi. Publicado originalmente em 1868, este é um desses livros em que o leitor reconhece de imediato a marca do gênio. Nele, o autor russo constrói um dos personagens mais impressionantes de toda a literatura mundial ― o humanista e epilético príncipe Míchkin, mescla de Cristo e Dom Quixote, cuja compaixão sem limites vai se chocar com o desregramento mundano de Rogójin e a beleza enlouquecedora de Nastácia Filíppovna. Entre os três se agita uma galeria de personagens de extrema complexidade, impulsionados pelos sentimentos mais contraditórios ― do amor desinteressado à canalhice despudorada ―, conferindo a cada cena uma intensidade alucinante que nunca se dissipa nem perde o foco. A tradução de Paulo Bezerra, a primeira realizada diretamente do russo em nosso país, traz para o leitor brasileiro toda a força da narrativa original.

RESENHA


O Idiota é um dos principais romances de Fiódor Dostoiévski, um dos maiores escritores russos de todos os tempos. Escrito entre 1867 e 1869, o livro retrata a sociedade russa do século XIX, em meio a transformações políticas, sociais e culturais. O autor, que viveu uma vida conturbada, marcada por problemas financeiros, doenças, prisões e exílios, reflete em sua obra questões existenciais, morais, religiosas e psicológicas, com uma profunda análise dos personagens e de seus conflitos.

O protagonista do romance é o príncipe Liév Nikoláievitch Míchkin, um jovem nobre que retorna à Rússia depois de passar vários anos em um sanatório na Suíça, tratando de sua epilepsia. Míchkin é um homem puro, bondoso, sincero e compassivo, que se choca com a corrupção, a hipocrisia, a violência e a ambição que dominam a sociedade em que vive. Ele é chamado de idiota pelos que o cercam, por não se adaptar às convenções e aos interesses mundanos. Sua inocência e sua generosidade são vistas como fraquezas e loucura, e ele acaba sendo vítima de intrigas, calúnias e explorações.

Míchkin se envolve em um triângulo amoroso com duas mulheres muito diferentes: Nastácia Filíppovna, uma bela e sofrida jovem que foi abusada na infância e que busca vingança contra seus algozes, e Aglaia Ivánovna, uma moça rica, orgulhosa e caprichosa, que se sente atraída pelo príncipe, mas que também o despreza. Além delas, Míchkin tem como rival o ardiloso e apaixonado Rogójin, um homem rico e violento, que disputa o amor de Nastácia e que nutre uma obsessão doentia por ela. O destino dos quatro personagens principais será trágico, marcado por desencontros, ciúmes, crimes e mortes.

O Idiota é uma obra-prima da literatura universal, que aborda temas universais e atemporais, como o bem e o mal, a culpa e o perdão, a fé e a dúvida, a razão e a emoção, a liberdade e o destino. O livro é também uma crítica à sociedade russa da época, que estava em crise de valores e de identidade, dividida entre a tradição e a modernidade, entre o Oriente e o Ocidente. Dostoiévski, que era um cristão ortodoxo e um patriota, defende em sua obra a necessidade de uma renovação espiritual e moral da Rússia, baseada no ideal evangélico do amor ao próximo e na valorização da cultura nacional.

O livro contém frases memoráveis, que expressam o pensamento e o sentimento dos personagens, bem como a visão de mundo do autor. Algumas delas são:

- "É melhor ser infeliz, porém estar inteirado disso, do que ser feliz e viver sendo feito de idiota." ¹
- "Os criadores e os génios, no início da sua carreira, quase sempre, e muitas vezes até no fim, sempre foram considerados pela sociedade como uns parvos e uns malucos — é esta uma das observações mais triviais e sabidas." 
- "De fato, não existe nada mais deplorável do que, por exemplo, ser rico, de boa família, de boa aparência, de instrução regular, não tolo, até bom, e ao mesmo tempo não ter nenhum talento, nenhuma peculiaridade, inclusive nenhuma esquisitice, nenhuma idéia própria, ser terminantemente como todo mundo." 
- "Quando a gente mente, ou seja, coloca com astúcia alguma coisa que acontece com excessiva raridade ou nunca acontece, aí a mentira se torna muito mais verossímil." 
- "A delicadeza e a dignidade é o próprio coração que ensina e não um mestre de dança." 

O Idiota é um livro que ensina muito sobre a natureza humana, sobre suas contradições, suas grandezas e suas misérias. É um livro que mostra como o amor pode ser fonte de salvação ou de perdição, de alegria ou de sofrimento, de vida ou de morte. É um livro que revela como a sociedade pode ser cruel e injusta com aqueles que são diferentes, que não se enquadram em seus padrões e que não seguem suas regras. É um livro que nos faz pensar sobre o que é ser idiota e o que é ser sábio, sobre o que é ser humano e o que é ser divino.

O Idiota é um livro de grande importância para a literatura mundial, pois influenciou vários escritores e artistas, que se inspiraram em seus personagens, em seu estilo e em seus temas. Entre eles, podemos citar Albert Camus, Franz Kafka, Marcel Proust, James Joyce, Virginia Woolf, Thomas Mann, Hermann Hesse, André Gide, Ernest Hemingway, Jorge Luis Borges, Gabriel García Márquez, José Saramago, Woody Allen, Akira Kurosawa, entre outros. O livro também foi adaptado para o cinema, o teatro, a ópera, a música e as artes plásticas, demonstrando sua riqueza e sua atualidade.

O AUTOR
Fiódor Dostoiévski (1821-1881) foi um escritor russo autor de Os Irmãos Karamázov e Crime e Castigo, obras-primas da literatura universal. Seus romances abordam questões existenciais e temas ligados à humilhação, culpa, suicídio, loucura e estados patológicos do ser humano.

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