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Como escreve: Fábio Shiva, autor de favela gótica


Fábio Shiva é músico, escritor e produtor cultural e uma figura multifacetada que tem conquistado admiradores com sua incrível habilidade de nos transportar para realidades alternativas.  Fundador da banda Imago Mortis e coautor e roteirista da primeira ópera rock em desenho animado do Brasil, ANUNNAKI - Mensageiros do Vento, Fábio Shiva nos presenteou com uma obra literária diversificada. Ele publicou livros de diversos gêneros, como romance policial, ficção especulativa, contos e obras infantojuvenis. Além disso, também se destaca como organizador de várias antologias poéticas.

É importante ressaltar que Fábio Shiva é um idealizador e proponente de projetos que foram aprovados em editais públicos, evidenciando seu talento e capacidade em atrair reconhecimento e apoio para suas criações. Sua excelência como autor também foi destacada ao ser convidado para participar da Bienal do Livro Bahia em 2022. Em sua mais recente obra, situada em uma realidade alternativa fascinante, somos introduzidos a uma metrópole infestada por criaturas sinistras. Nesse dantesco cenário, acompanhamos a jornada de Liana, uma jovem zumbi em busca do autoconhecimento e da iluminação, enquanto lida com os monstros internos e externos que a cercam. Uma trama repleta de assassinatos, perseguições e surpreendentes reviravoltas, que envolve também a presença de seres interdimensionais e a iminência de um asteroide prestes a colidir com a Terra.

Preparem-se para desbravar um universo repleto de monstruosidades e desafios, onde a crueldade e a crueza da cidade grande são reveladas de forma intensa. Em cada página, Fábio Shiva nos conduzirá por um caminho de reflexão e entretenimento, nos instigando a explorar os limites da nossa própria natureza. Não percam essa oportunidade única de conhecer mais sobre a mente brilhante por trás dessas obras incríveis. Acompanhem nossa entrevista com Fábio Shiva e embarquem em uma viagem literária extraordinária.

1. Quando decidiu que se tornaria um escritor?

Tenho uma lembrança nítida do momento exato em que tomei a decisão de me tornar um escritor. Eu tinha 11 anos, e contemplava embevecido os poucos livros que já havia juntado em minha estante: alguns volumes de Agatha Christie e José de Alencar, minhas duas primeiras paixões literárias, além de coleções iniciadas de Sherlock Holmes e Perry Rhodan. Senti um grande deslumbramento e uma gratidão profunda pela magia dos livros, que é capaz de criar mundos e tantos seres interessantes, que nos permite viver tantas vidas diferentes em uma só vida. E decidi que eu seria um aprendiz de feiticeiro: queria aprender a fazer essa mágica com as palavras.

 

2. Qual foi o seu primeiro livro escrito? Você chegou a concluí-lo? Já abandonou algum projeto de escrita?

O primeiro livro que comecei a escrever chamava-se “O Profeta Canibal”, e era uma espécie de mistura de “Assim Falou Zaratustra” com “O Silêncio dos Inocentes”: Zamireb Samir, o tal profeta, tinha como lema “decifro-te e te devoro”, e dava aulas de filosofia visceral entremeadas com dentadas em seus alunos... Nunca cheguei a concluir essa história, mas transformei-a em uma peça teatral que aparece no primeiro livro que de fato publiquei, o romance policial “O SINCRONICÍDIO: Sexo, Morte & Revelações Transcendentais”.

 

3. Como você escolhe os temas e o enredo dos seus livros?

Até publicar “O Sincronicídio”, eu tinha certeza absoluta de que seria um autor de romances policiais, exclusivamente. Contudo a magia da Literatura foi atuando de modo imprevisível em minha vida, levando-me a escrever sobre temas e gêneros bem diversos: ficção científica e especulativa, literatura fantástica, infantojuvenil e até humor. Isso para não mencionar a Poesia, que tem me acompanhado desde a infância. Hoje acredito que não sou eu quem escolhe os livros que vou escrever. São os livros que decidem vir ao mundo por meu intermédio. Cada livro que escrevo chega com uma mensagem que preciso descobrir. Cada vez mais procuro me tornar receptivo a esse processo. Essa convicção é ancorada na linda definição de Ezra Pound: “o artista é a antena da raça”. Procuro captar e transmitir o que me chega. Esse é o meu ofício de escritor.

 

4. Você se inspira em algum autor ou obra específica para escrever?

Eu me inspiro em tudo e todos. Alimento minha criatividade não só com os livros que leio, mas com tudo o que chega à minha consciência, sejam manifestações artísticas como filmes, música, dança, pinturas, ou mesmo com a ficção altamente inverossímil a que chamamos realidade. Para citar uma influência específica, evoco a máxima de Pablo Picasso: “Imitar os outros é necessário. Imitar a si mesmo é que é ridículo.”

 

5. Existe algum ritual para se escrever um livro? Qual funciona para você?

O ritual é bom por um lado, por que gera um condicionamento mental que facilita o processo de escrever. Por outro lado, é algo perigoso, pois pode se tornar algo limitante, como uma prisão. Por isso eu procuro variar meus rituais de tempos em tempos. Passei uma época contando palavras, hoje estabeleço um horário diário dedicado à escrita. Às vezes escrevo à mão, às vezes digito. Atualmente, estou escrevendo bem durante o café da manhã. Vou dormir pensando na cena seguinte que quero escrever e, ao acordar, procuro colocar essa cena no papel.

 

6. Quais são seus livros publicados atualmente? Qual foi o mais complexo?

Até o momento publiquei três romances: o já mencionado “O Sincronicídio”, “Favela Gótica”, de ficção especulativa, e um romance de não-ficção, “Diário de um Imago: contos e causos de uma banda underground”, que conta a história da banda Imago Mortis. Também publiquei três livros de contos: “Tanto Tempo Dirigindo Sem Ninguém No Retrovisor”, “Labirinto Circular” e “Isso Tudo É Muito Raro”. Além desses, um livro infantil: “Meditação para Crianças”, que ensina a técnica de meditação por meio de versos rimados. Como organizador, publiquei várias antologias de Poesia, além de um livro verdadeiramente coletivo: “Escritores Perguntam, Escritores Respondem”. Desses todos, considero o mais complexo o primeiro, o romance policial “O Sincronicídio”, que é estruturado como uma mistura entre o jogo de xadrez e o oráculo chinês do I Ching, com 64 capítulos fora da ordem numérica que percorrem o chamado “Passeio do Cavalo”, um problema enxadrístico, através dos 64 hexagramas do I Ching. Levei quatro anos escrevendo esse livro. Depois, senti o desejo de experimentar coisas mais simples e diretas.

 

 

7. Você utiliza rascunhos, anotações ou esboços para não se perder na escrita?

Sim, costumo criar no mínimo dois arquivos de texto para cada livro. Um é o livro propriamente, e o outro contém referências à trama e aos personagens, além de observações diversas.

 

8. O que não pode faltar durante seu processo criativo? Como você lida com a ausência de inspiração?

Acho que o que não pode faltar é a determinação de escrever. Nunca tive propriamente ausência de inspiração, mas sim preguiça de escrever, o desejo de procrastinar, ou mesmo fiquei empacado em algum trecho que não fluía. Procuro respeitar o meu momento, sem me violentar, mas também sabendo que às vezes se não forçar um pouco a mão, a coisa não sai.

 

9. O que podemos esperar para os seus próximos livros?

Algo completamente diferente do que já fiz antes. Isso é tudo o que posso garantir.

 

10. Como você enxerga a vida dos autores no cenário político atual?

Alguns autores defendem que aquilo que escrevem está de algum modo à parte da vida política. Não creio que isso seja possível, atualmente ou em qualquer época. Todo ato é um ato político, assim como toda ação é motivada por alguma ideologia. Com o ato de escrever não poderia ser diferente. O que sinto que há de diferente em nosso momento atual é que a verdade parece ter cada vez menos relevância no debate político. Independente dos posicionamentos, as pessoas estão de forma mais ou menos consciente abraçando as narrativas de sua bolha, em detrimento da verdade. Isso está ficando cada vez mais explícito, ao meu ver. Em cada situação de conflito, cada vez menos pessoas se preocupam de fato em descobrir o que aconteceu, e cada vez mais pessoas adotam a narrativa de seu lado da briga, e ficam repetindo essa narrativa como um mantra, para vencer a narrativa oposta. Penso que toda pessoa que assume a responsabilidade de escrever deve refletir profundamente sobre esse fenômeno.

 

11. Que conselho você daria para alguém que quer escrever o primeiro livro?

Compartilho a melhor definição que li sobre o nosso doce e penoso ofício, formulada por Sinclair Lewis: “Escrever é a arte de sentar o traseiro em uma cadeira.”

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