a casa (pág. 16)
a casa me parece um quadrado retângulo toda simétrica com quarto sala cozinha banheiro quarto escadas banheiro escritório quarto jardim não nessa ordem mas quase pois eu lembro que os dois quartos lá de cima têm uma vista larga da cidade três janelonas cinco pares de plantas que desconheço desconheço muita coisa aqui principalmente a sinuosidade das escadas as escadas são terríveis no escuro eu fico tateando na meia luz com um medo danado de cair lá de cima mas não tirei as escadas nem posso o relógio também me incomoda o relógio não funciona os móveis continuam no mesmo lugar os móveis da minha infância os verbos traduzidos em ilusão pois minha mala está escancarada na sala desfiando por causa do mofo
o olhar do narrador (pág. 32)
…é como narrar algo assim:
ela subia as escadas devagar, tremendo da cabeça aos pés. a porta gigantesca do tamanho do desejo de saber o que ela escondia. escondia mesmo? ou ela buscava suposições para continuar na casa? lembrou-se que restava menos de dois dias. quase dois segundos. deitou o ouvido na madeira, para escutar os batimentos. tentou de tudo. a força, o chute, a rebeldia. a porta se manteve intacta. tentou outros truques:
fósforo (pág. 61)
— O vento soprou a chama e apagou. É assim agora?
— Assim, como? A duração de segundos, entre um fósforo e outro?
— Consegue me enxergar? — eu falo com medo.
— Entre um fósforo e outro. É bem rápido.
— Tem certeza que sou eu?
Minibio da autora: Zulmira Correia (@zulmiracorreia_) é escritora, designer, artista e pesquisadora. É de Crato, Região do Cariri, Ceará. Vencedora do V Prêmio Cepe Nacional de Literatura, da Companhia Editora de Pernambuco, na categoria poesia, com o livro de estreia “As cartas de Maria”, sendo a autora mais jovem e única nordestina a levar o prêmio na edição, em 2020. Voltou a publicar em 2023, com o segundo livro “Abissal”, pela Editora Patuá. Em 2024, lançou “A duração entre um fósforo e outro”, vencedor do I prêmio com.tato de literatura.
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