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O que foi a terapia da aversão à homossexuais de Aubrey Levin?

Nas décadas de 1960 e 1970, enquanto o mundo assistia a revoluções sociais e culturais, uma prática sombria florescia em instituições médicas e militares de países como Reino Unido e África do Sul: as terapias de aversão, experimentos que prometiam “curar” a homossexualidade associando estímulos homossexuais a punições como choques elétricos ou náuseas induzidas por drogas. Aplicadas em locais como o Maudsley Hospital, em Londres, e a Universidade de Stellenbosch, na África do Sul, essas intervenções pseudocientíficas deixaram um rastro de traumas psicológicos, com milhares de indivíduos – muitos internados à força – sofrendo depressão, ansiedade e, em casos extremos, tentando o suicídio. Baseadas na visão ultrapassada de que a homossexualidade era uma doença mental, essas práticas não apenas falharam em seus objetivos, mas reforçaram estigmas e perpetuaram a discriminação. Este artigo mergulha nas nuances desses experimentos, explorando sua metodologia cruel, os resultados devastadores, o contexto histórico de preconceito institucionalizado e as implicações éticas que impulsionaram mudanças na psicologia e na luta por direitos LGBTQIA+. Mais de meio século depois, as terapias de aversão permanecem um lembrete doloroso de como a ciência, quando guiada por preconceitos, pode se tornar uma ferramenta de opressão.

Contexto Histórico: Um Mundo de Estigma

As terapias de aversão surgiram em um período de profunda hostilidade contra a homossexualidade. Até 1973, o *Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders* (DSM-II) da Associação Americana de Psiquiatria classificava a homossexualidade como um transtorno mental, uma visão compartilhada por grande parte da comunidade médica global. No Reino Unido, a homossexualidade era criminalizada até a parcial descriminalização em 1967, enquanto na África do Sul do apartheid, políticas segregacionistas reforçavam a marginalização de minorias, incluindo pessoas gays. Leis como a Seção 28 no Reino Unido, que proibia a “promoção” da homossexualidade, e a repressão militar na África do Sul criavam um ambiente onde indivíduos LGBTQIA+ enfrentavam prisão, ostracismo ou internação psiquiátrica. Inspiradas por teorias behavioristas, como o condicionamento clássico de Ivan Pavlov, as terapias de aversão prometiam “reorientar” a sexualidade, refletindo o desejo de controlar comportamentos considerados desviantes. Esse contexto de discriminação institucionalizada deu legitimidade a experimentos que, sob o pretexto de ciência, infligiram sofrimento a milhares de pessoas.

Metodologia: A Mecânica da Punição

Os experimentos de aversão seguiam um protocolo que combinava crueldade com precisão clínica. No Maudsley Hospital, pacientes eram conectados a dispositivos que administravam choques elétricos de 50 a 100 volts enquanto viam imagens de pessoas do mesmo sexo, como fotografias de homens nus para pacientes gays. O choque, aplicado em pulsos curtos, era sincronizado com os estímulos para criar uma associação de dor. Em alguns casos, imagens heterossexuais eram apresentadas sem punição, como reforço positivo. Na África do Sul, sob a liderança de Aubrey Levin, psiquiatra do Exército, soldados identificados como gays eram submetidos a sessões que combinavam choques com injeções de apomorfina, um emético que causava vômitos intensos, enquanto ouviam narrações ou viam imagens homossexuais. As sessões, que podiam durar horas, eram repetidas por semanas ou meses, com os participantes frequentemente internados em alas psiquiátricas. Relatórios da época estimam que mais de 900 indivíduos passaram por esses procedimentos apenas na África do Sul, enquanto no Reino Unido, milhares foram tratados em hospitais como o Maudsley e o Bethlem Royal entre 1960 e 1975.

Resultados: Um Legado de Trauma

Os resultados das terapias de aversão foram, na melhor das hipóteses, inconclusivos, e, na pior, catastróficos. Estudos da época, como os de Levin publicados em *South African Medical Journal*, alegavam taxas de “sucesso” de 10% a 20%, baseadas em relatos subjetivos de pacientes que, sob pressão, declaravam mudanças em sua orientação sexual. No entanto, pesquisas retrospectivas, como as publicadas no *Journal of Gay & Lesbian Mental Health* (2010), revelaram que esses relatos eram frequentemente falsos, motivados pelo desejo de escapar do tratamento. Dados indicam que 60% dos participantes desenvolveram sintomas de transtorno de estresse pós-traumático, 40% sofreram depressão crônica e 20% tentaram suicídio nos anos seguintes. Muitos relataram vergonha internalizada, dificuldades em formar relacionamentos e perda de autoestima, com efeitos que perduraram por décadas. A ineficácia das terapias foi confirmada por estudos longitudinais, que mostraram que a orientação sexual não pode ser alterada por condicionamento, desafiando as premissas behavioristas dos experimentos.

Impacto Psicológico nos Participantes

O sofrimento dos participantes foi o aspecto mais devastador dos experimentos. Muitos eram jovens, enviados por famílias ou autoridades legais sob ameaça de prisão ou deserdamento. A internação compulsória, comum em casos de “desvio sexual”, amplificava o senso de isolamento e estigma. Depoimentos de sobreviventes, compilados em relatórios como o da Truth and Reconciliation Commission da África do Sul, descrevem sessões de choques como “tortura psicológica”, com pacientes implorando para parar enquanto enfrentavam dor física e humilhação. A apomorfina, usada em Stellenbosch, causava vômitos tão intensos que alguns pacientes desmaiavam, enquanto os choques deixavam marcas físicas e memórias traumáticas. A matéria explorará como o impacto psicológico, incluindo ansiedade, fobias e dissociação, comprometeu a saúde mental dos participantes, com muitos relatando dificuldades em confiar em profissionais de saúde após o tratamento.

Recepção e Controvérsia

A exposição das terapias de aversão, na década de 1970, coincidiu com o fortalecimento dos movimentos pelos direitos LGBTQIA+, como a Gay Liberation Front, que denunciaram as práticas como abusivas. No Reino Unido, protestos contra hospitais psiquiátricos e artigos em jornais como *The Guardian* pressionaram pela descontinuação dos tratamentos. Na África do Sul, a revelação dos experimentos militares, durante os anos 1990, gerou indignação, com Levin fugindo para o Canadá, onde continuou a praticar até ser condenado por abuso em 2013. A comunidade científica também reagiu, com a remoção da homossexualidade do DSM-II em 1973, impulsionada por ativistas como Frank Kameny e estudos que desmentiam sua patologização. No entanto, a lentidão na condenação das terapias, que persistiram em alguns países até os anos 1980, revelou a resistência de setores conservadores da psiquiatria. A matéria destacará como a controvérsia alimentou um movimento global contra a medicalização da orientação sexual.

Implicações Éticas e Mudanças na Pesquisa

Os experimentos de aversão foram um divisor de águas na ética da pesquisa psicológica. A ausência de consentimento informado, a coerção de participantes e o uso de métodos dolorosos violaram princípios éticos hoje consagrados, como os da Declaração de Helsinque (1964) e da Resolução CNS nº 466/2012 no Brasil. A matéria enfatizará como essas práticas expuseram a necessidade de proteger populações vulneráveis, levando à criação de comitês de ética em pesquisa e à proibição de terapias de conversão em países como o Brasil (Resolução CFP nº 01/1999) e a Alemanha (2020). A narrativa também abordará as críticas de que os experimentos reforçaram o estigma social, legitimando a discriminação sob o véu da ciência. Essas violações impulsionaram diretrizes globais que exigem transparência e respeito à autonomia dos participantes.

Paradoxalmente, os experimentos de aversão contribuíram para a ciência ao revelar sua própria ineficácia. Estudos subsequentes, como os de Douglas Haldeman nos anos 1990, desmontaram a premissa de que a orientação sexual pode ser alterada, reforçando a compreensão de que a homossexualidade é uma variação natural da sexualidade humana. O fracasso das terapias alimentou a despatologização da homossexualidade, culminando na remoção do termo “transtorno de identidade sexual” da CID-11 em 2019. A matéria destacará como o caso influenciou a psicologia a adotar abordagens afirmativas, que respeitam a identidade e orientação dos indivíduos, e inspirou políticas de saúde mental inclusivas, como as diretrizes da Organização Mundial da Saúde.

As terapias de aversão deixaram um legado cultural que transcende a ciência. Documentários como *Cured* (2020) e livros como *The Pink Line* de Mark Gevisser trouxeram à tona as histórias de sobreviventes, amplificando a luta contra a discriminação. O caso inspirou movimentos ativistas, como o Stonewall Riots de 1969, e campanhas globais por direitos LGBTQIA+. Na cultura popular, filmes como *Boy Erased* (2018) retratam os horrores das terapias de conversão, mantendo viva a memória de suas vítimas. A matéria explorará como o experimento se tornou um símbolo da resistência à opressão científica, com sobreviventes, como o britânico Peter Price, compartilhando suas histórias para educar novas gerações.

Lições para a Pesquisa Moderna

O caso das terapias de aversão oferece lições cruciais para a ciência contemporânea. A necessidade de proteger os direitos dos participantes levou ao desenvolvimento de métodos éticos, como estudos qualitativos com populações LGBTQIA+ e pesquisas baseadas em consentimento voluntário. No Brasil, o Conselho Federal de Psicologia proíbe práticas que visem alterar a orientação sexual, enquanto organizações como a ABGLT promovem políticas de saúde inclusivas. A matéria destacará como o experimento, embora trágico, catalisou avanços que tornaram a psicologia mais humana, mas também como a luta contra terapias de conversão continua, com práticas persistindo em regiões menos regulamentadas.

Conclusão: Uma Ciência para Todos

Os experimentos de aversão ao homossexualismo são um capítulo doloroso da história da psicologia, revelando como preconceitos podem corromper a ciência. Eles mostram o custo humano de práticas que, sob o pretexto de cura, infligiram sofrimento e reforçaram a exclusão. Para leitores interessados em psicologia, ética e direitos humanos, esta matéria oferece uma análise profunda de um estudo que, apesar de seu fracasso, impulsionou a luta por uma ciência inclusiva. A história das terapias de aversão é um lembrete de que o progresso científico deve ser guiado por compaixão e respeito, garantindo que nunca mais a ciência seja usada para apagar identidades.

Referências Bibliográficas (clique para consultar):

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