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10 Razões Para Ler "Forte como a Morte", de Otto Leopoldo Winck


1. Narrativa Complexa e Envolvente: "Forte como a Morte" é um romance que tece de forma magistral três histórias distintas, criando uma trama fascinante que prende a atenção do leitor.

2. Riqueza de Referências: A obra está repleta de referências teológicas, filosóficas e literárias, oferecendo uma experiência intelectualmente estimulante para o leitor.

3. Abordagem da Teologia da Libertação: O romance explora com profundidade os temas da teologia da libertação, trazendo à tona questões de justiça social e opção preferencial pelos pobres.

4. Diálogo com a Mística Cristã: Winck mergulha nas noções de sofrimento, sacrifício e transcendência presentes na tradição mística cristã, conferindo à narrativa uma dimensão espiritual.

5. Questionamento da Fé e da Razão: A obra convida o leitor a refletir sobre a relação entre fé, razão e mistério, explorando as limitações da linguagem e do conhecimento racional.

6. Influências Filosóficas: O romance dialoga com o pensamento de filósofos como Wittgenstein e Kierkegaard, trazendo à tona questões fundamentais sobre a condição humana.

7. Estrutura Não Linear: A organização não linear da narrativa, com suas intercalações e justaposições, cria uma experiência de leitura desafiadora e enriquecedora.

8. Riqueza Linguística: A escrita de Winck é marcada por um cuidado estilístico e uma riqueza lexical que convidam o leitor a uma imersão na língua portuguesa.

9. Temas Universais: Apesar de suas referências eruditas, a obra aborda questões fundamentais da existência humana, como a busca de sentido, o sofrimento e a solidão.

10. Convite à Reflexão: "Forte como a Morte" é um romance que não se limita a entreter, mas desafia o leitor a mergulhar em uma jornada de reflexão e interpretação, estimulando o pensamento crítico.

Não deixe de explorar essa obra excepcional de Otto Leopoldo Winck, que une profundidade intelectual e sensibilidade narrativa em uma experiência de leitura inesquecível.

10 Razões para Ler "Senhor Cão", de Flávio Ilha

1. Narrativa Intrincada 

O romance "Senhor Cão" de Flávio Ilha apresenta uma narrativa complexa e não linear, que desafia o leitor a acompanhar o fluxo de consciência dos personagens. Essa estrutura fragmentada cativa a atenção e convida o leitor a mergulhar na trama.


2. Personagens Memoráveis

A obra é povoada por personagens ricos e multidimensionais, cada um com sua própria história e perspectiva. Desde o protagonista Pedro Flávio Póvoa até as figuras secundárias, como Dona Leda e Eulália, todos ganham vida de forma marcante.


3. Linguagem Poética e Evocativa

A prosa de Flávio Ilha é marcada por uma riqueza de recursos literários, com uma linguagem metafórica e lírica. Essa abordagem estilística cria um ambiente sombrio e introspectivo, que reflete o estado emocional dos personagens.


4. Exploração da Condição Humana

"Senhor Cão" se debruça sobre temas universais da existência, como a solidão, a busca pela identidade e os conflitos familiares. A obra convida o leitor a refletir sobre a complexidade da vida e as consequências de nossas escolhas.


5. Retrato Realista de Dinâmicas Familiares

O romance retrata de forma crua e reveladora as dinâmicas familiares, explorando a fragilidade dos laços afetivos e as consequências devastadoras dos conflitos domésticos. Essa representação é uma forte crítica social presente na obra.


6. Estrutura Fragmentada

A narrativa não linear e a estrutura fragmentada de "Senhor Cão" exigem do leitor uma imersão ativa e atenta. Essa abordagem formal reflete a própria condição existencial dos personagens, em constante busca por respostas.


7. Exploração da Violência e da Culpa

O romance não se furta a abordar temas delicados, como a violência e a culpa. A forma como esses elementos são retratados suscita reflexões profundas sobre a natureza humana.


8. Riqueza de Detalhes e Ambientação

Flávio Ilha constrói um universo ficcional detalhado e convincente, com uma ambientação que evoca os diferentes espaços e épocas retratados na obra. Essa riqueza de detalhes contribui para a imersão do leitor.


9. Relevância Temática Contemporânea

Embora se passe em um contexto temporal específico, as temáticas abordadas em "Senhor Cão" ressoam com questões relevantes da atualidade, como a solidão, a identidade e os conflitos sociais.


10. Experiência de Leitura Envolvente e Inesquecível

Ao final, a leitura de "Senhor Cão" se configura como uma experiência imersiva e transformadora. O leitor sairá da obra com reflexões profundas e uma impressão indelével dos personagens e de suas histórias.

10 Razões para Ler "Ossada Perpétua", de Anna Kuzminska


1. Exploração Profunda do Luto e da Perda

"Ossada Perpétua" mergulha de forma visceral no processo de luto, explorando a maneira como a ausência de um ente querido afeta cada membro da família. A narrativa cativa o leitor ao apresentar uma perspectiva íntima e comovente sobre a dor da perda e a busca por significado após a morte.


2. Estrutura Narrativa Inovadora

O livro apresenta uma estrutura não linear e fragmentada, intercalando trechos de prosa poética com fragmentos de diários de quarentena. Essa abordagem não convencional desafia o leitor a construir sua própria compreensão da história, tornando a experiência de leitura ainda mais envolvente.


3. Linguagem Bela e Evocativa

A escrita de Anna Kuzminska é marcada por uma beleza poética e uma riqueza de imagens metafóricas. A prosa lírica e introspectiva transporta o leitor para o universo emocional dos personagens, criando uma experiência sensorial e profunda.


4. Reflexões sobre Isolamento 

O isolamento dos personagens e a dificuldade de se conectar com os outros são temas centrais na obra. Essa exploração do silêncio e da falta de entendimento mútuo ressoa de forma potente, especialmente em um contexto pós-pandêmico.


5. Questionamento das Fronteiras entre Vida e Morte

A crença da mãe de que o pai falecido precisa ser resgatado desafia as noções convencionais sobre a finitude da existência. Essa premissa convida o leitor a refletir sobre a natureza da realidade e a possibilidade de uma conexão transcendental entre os vivos e os mortos.


6. Perspectiva Intimista 

As seções de diários de quarentena oferecem uma visão íntima e confessional da autora, permitindo que o leitor se aproxime de seus pensamentos e sentimentos. Essa abordagem adiciona uma camada de autenticidade e vulnerabilidade à narrativa.


7. Exploração da Identidade 

A obra aborda a jornada de autoconhecimento da narradora, enquanto ela luta para encontrar um significado em meio à perda e ao isolamento. Essa exploração da identidade e da busca por propósito ressoará com muitos leitores.


8. Representação Única da Experiência Familiar

A dinâmica familiar retratada em "Ossada Perpétua" é complexa e autêntica, refletindo as nuances das relações entre irmãos, pais e filhos. A forma como a autora captura essas interações íntimas é profundamente comovente.


9. Relevância Contemporânea

Embora a narrativa não esteja diretamente ligada à pandemia de COVID-19, os temas de isolamento, adaptação e a relação com a morte ressoam de forma poderosa em um contexto pós-pandêmico, tornando a obra particularmente relevante para os leitores de hoje.


10. Experiência de Leitura Transformadora

Ao mergulhar na narrativa de "Ossada Perpétua", o leitor é convidado a refletir sobre suas próprias experiências de luto, conexão e busca de significado. A obra tem o potencial de provocar uma transformação emocional e intelectual, deixando uma marca duradoura.

"Ossada Perpétua" de Anna Kuzminska é uma obra literária extraordinária que transcende os limites do gênero. Com sua estrutura inovadora, linguagem poética e exploração profunda de temas universais, este livro oferece uma experiência de leitura única e memorável. Seja você um leitor apaixonado por ficção ou simplesmente alguém em busca de uma narrativa que desafia e enriquece, "Ossada Perpétua" é uma leitura imperdível.

Resenha: Forte como a Morte de Otto Leopoldo Winck


A obra "Forte como a Morte" de Otto Leopoldo Winck é uma narrativa complexa e multifacetada que entrelaça três histórias distintas em uma trama. O romance se destaca pela riqueza de suas referências teológicas, filosóficas e literárias, tecendo uma intrincada rede de significados que convida o leitor a uma jornada de reflexão e interpretação. O livro é estruturado de forma não linear, com as três narrativas principais - a de Rosália menina, a de Rosália mãe e a do reencontro do narrador com a personagem Betina - intercaladas em doze partes. Essa estrutura fragmentada, à primeira vista, pode parecer desafiadora, mas revela-se uma escolha narrativa deliberada, que evoca a imagem de uma rosácea, com seus padrões complexos e significados multifacetados.

A narrativa principal acompanha a jovem Rosália Klossosky, uma adolescente que apresenta estigmas semelhantes aos de Cristo, em uma pequena comunidade rural no sul do Brasil. Essa história é permeada por referências à teologia da libertação, à mística cristã e a questões sociais e políticas, como a luta pela reforma agrária. Paralelamente, a narrativa do narrador-padre, que reencontra uma antiga conhecida, Betina, no último Natal, traz à tona reflexões sobre a crise de fé, o papel do sacerdócio e a solidão do indivíduo.

Um dos aspectos mais notáveis da obra é sua abordagem teológica. Winck demonstra profundo conhecimento da tradição cristã, explorando conceitos como a kênosis (esvaziamento divino), a Shekinah (presença divina no mundo) e a relação entre fé, razão e mistério. A narrativa evoca a teologia da libertação, com sua ênfase na opção preferencial pelos pobres e na luta por justiça social, bem como a mística cristã, com suas noções de sofrimento, sacrifício e transcendência.

Além disso, o romance dialoga com a filosofia, especialmente com as ideias de Wittgenstein e Kierkegaard, que questionam a capacidade da linguagem e da razão de apreender plenamente a realidade. Essa abordagem filosófica contribui para a construção de uma narrativa que se recusa a fornecer respostas definitivas, deixando espaço para a ambiguidade e o mistério.

"Forte como a Morte" é uma obra de grande riqueza e complexidade, que desafia o leitor a mergulhar em uma trama intrincada de referências teológicas, filosóficas e literárias. Winck habilmente tece uma narrativa que questiona noções de fé, razão e mistério, convidando o leitor a uma jornada de reflexão e interpretação. Trata-se de um romance que se destaca pela sua abordagem erudita e pela sua capacidade de suscitar profundas indagações sobre a condição humana.

Resenha: Senhor Cão, de Flávio Ilha

A obra "Senhor Cão" do autor Flávio Ilha é uma narrativa complexa e multifacetada que explora temas profundos da condição humana, como a solidão, a busca pela identidade, os conflitos familiares e as consequências das escolhas individuais. Publicado em 2024 pela editora Aboio, o romance se destaca pela sua estrutura fragmentada, pela riqueza de personagens e pela abordagem poética da linguagem.

O romance "Senhor Cão" é composto por nove capítulos, cada um deles com um título que evoca uma temática central da obra. A narrativa é construída de forma não linear, com saltos temporais e espaciais que desafiam o leitor a acompanhar o fluxo de consciência dos personagens. Essa estrutura fragmentada reflete a própria condição existencial dos protagonistas, que se encontram em constante busca por respostas e sentido para suas vidas.

Ao longo da obra, o leitor é apresentado a uma diversidade de personagens, cada um com sua própria história e perspectiva. Destaca-se a figura de Pedro Flávio Póvoa, o protagonista, cuja trajetória é marcada por uma série de escolhas e ações que o levam a um profundo isolamento e conflito interno. Outros personagens, como Dona Leda, Eulália e Quim, também ganham destaque, revelando as complexas dinâmicas familiares e as consequências das ações de Pedro.

A linguagem utilizada por Flávio Ilha em "Senhor Cão" é marcada por uma riqueza poética e metafórica. O autor faz uso de uma prosa lírica e introspectiva, que permite uma imersão profunda nos pensamentos e emoções dos personagens. Essa abordagem estilística contribui para a construção de um ambiente sombrio e introspectivo, refletindo o estado de espírito dos protagonistas.

As temáticas centrais da obra giram em torno da solidão, da busca pela identidade, dos conflitos familiares e das consequências das escolhas individuais. O romance explora a forma como a ausência de figuras paternas e a fragilidade dos laços familiares afetam profundamente a vida dos personagens. Além disso, a obra também aborda questões relacionadas à moralidade, à violência e à culpa.

Análise Crítica

"Senhor Cão" se destaca como uma obra literária de grande complexidade e profundidade. O autor, Flávio Ilha, consegue criar uma narrativa que desafia o leitor a refletir sobre temas universais da condição humana, sem, no entanto, oferecer respostas definitivas. A estrutura fragmentada e a linguagem poética contribuem para uma experiência de leitura imersiva e envolvente.

Um dos aspectos mais notáveis da obra é a forma como Ilha retrata a solidão e a busca pela identidade dos personagens. Pedro Flávio Póvoa, em particular, é um protagonista complexo e multifacetado, cuja trajetória é marcada por uma série de escolhas e ações que o levam a um profundo isolamento. Essa representação da solidão humana é uma das principais forças do romance, ressoando com o leitor de maneira profunda.

Outro aspecto relevante é a abordagem de Ilha em relação aos conflitos familiares. A dinâmica entre os personagens, marcada por ausências, traições e incompreensões, revela a fragilidade dos laços afetivos e as consequências devastadoras que esses conflitos podem ter. Essa representação da família como um espaço de tensão e desafios é uma forte crítica social presente na obra.

Em suma, "Senhor Cão" de Flávio Ilha é uma obra literária de grande riqueza e complexidade. Através de uma narrativa fragmentada e uma linguagem poética, o autor consegue explorar temas universais da condição humana, como a solidão, a busca pela identidade e os conflitos familiares. A obra desafia o leitor a refletir sobre suas próprias escolhas e a forma como elas podem impactar sua vida e a vida daqueles ao seu redor.

Ao final, "Senhor Cão" se destaca como uma contribuição importante para a literatura contemporânea, oferecendo uma perspectiva profunda e emocionante sobre a complexidade da existência humana.

Resenha: Ossada perpétua, de Anna Kuzminska

"Ossada Perpétua" de Anna Kuzminska é uma obra literária que transcende os limites do gênero, mesclando elementos de ficção, poesia e diários de quarentena. O livro apresenta uma narrativa intricada, explorando temas profundos como luto, isolamento e a relação entre os vivos e os mortos. Através de uma prosa poética e fragmentada, a autora conduz o leitor em uma jornada emocional que desafia as noções convencionais de realidade e existência.

A narrativa de "Ossada Perpétua" é apresentada em uma estrutura não linear, com diferentes camadas que se entrelaçam. O ponto de partida é o sonho da mãe da narradora, que acredita que o pai falecido está sofrendo e precisa ser resgatado de seu local de descanso. Essa premissa desencadeia uma série de eventos que envolvem a família, à medida que eles se reúnem para lidar com a situação inusitada.

Ao longo da obra, o leitor é apresentado a uma série de memórias e reflexões da narradora, que explora sua relação com a mãe e a forma como ela lida com a ausência do pai. Essas lembranças são intercaladas com fragmentos dos diários de quarentena da autora, que oferecem uma perspectiva paralela e contemplativa sobre temas como a morte, a mudança e a busca pela própria identidade.

A estrutura fragmentada do livro reflete a natureza caótica e imprevisível da experiência humana. Cada capítulo ou seção apresenta uma perspectiva única, desafiando o leitor a construir uma compreensão holística da narrativa. Essa abordagem não linear permite que a autora explore a complexidade das emoções e das relações familiares, evitando respostas simplistas ou conclusões definitivas.

Um dos temas centrais de "Ossada Perpétua" é o luto e a forma como ele molda a experiência dos personagens. A ausência do pai é sentida de maneiras distintas por cada membro da família, revelando as diferentes formas pelas quais as pessoas lidam com a perda e a saudade. A narradora, em particular, luta para encontrar um significado na morte do pai e para aceitar a sua partida.

Outro tema proeminente é o isolamento e a dificuldade de se comunicar. Tanto a mãe quanto a narradora parecem estar aprisionadas em seus próprios mundos interiores, incapazes de se conectar plenamente com os outros. O silêncio e a falta de compreensão mútua são apresentados como barreiras que impedem a cura e a reconciliação.

Além disso, a obra explora a relação entre os vivos e os mortos, questionando as noções convencionais sobre a finitude da existência. A crença da mãe de que o pai está sofrendo e precisa ser resgatado desafia as fronteiras entre a vida e a morte, convidando o leitor a refletir sobre a natureza da realidade e a possibilidade de uma conexão transcendental.

A linguagem utilizada em "Ossada Perpétua" é marcada por uma beleza poética e uma profundidade introspectiva. A autora emprega uma prosa lírica e evocativa, com uma riqueza de imagens e metáforas que transportam o leitor para o universo emocional dos personagens.

O estilo fragmentado da narrativa, com alternância entre prosa e poesia, reflete a natureza fragmentada da experiência humana. As seções de diários de quarentena, em particular, oferecem uma perspectiva íntima e confessional, permitindo que o leitor se aproxime dos pensamentos e sentimentos da autora.

"Ossada Perpétua" é uma obra literária de grande complexidade e profundidade. Através de uma narrativa não linear e uma linguagem poética, a autora Anna Kuzminska explora temas universais como luto, isolamento e a relação entre os vivos e os mortos. A estrutura fragmentada do livro desafia o leitor a construir sua própria compreensão da história, convidando-o a refletir sobre a natureza da realidade e a busca pelo significado na vida.

Resenha: Dentes de leite, Antonio Pokrywiecki



APRESENTAÇÃO

Em sua estreia na contística, Antonio Pokrywiecki percorre — com propósito e, quando quer, com maldade — a ambiguidade dos signos do medo e do trauma. A imprevisibilidade que assombra pode ser tão assustadora quanto os próprios monstros. E os monstros também não fogem. Mas podem ser provisórios.

RESENHA

Em "Dentes de leite", de Antônio Pokrywiecki somos apresentados a um conjunto de narrativas interligadas que se desenrolam em igual intensidade. Iniciando em 'o balneário', tendo como pano de fundo uma praia local que serve não apenas como cenário, mas como um símbolo profundo de introspecção e transformação nas relações interpessoais. A obra, rica em nuances emocionais, mergulha nas complexidades das conexões humanas, abordando temas como amor, solidão e a inevitável passagem do tempo. A narrativa inicia-se com um grupo de amigos, liderados por X, que se reúnem anualmente em uma praia que, embora marcada pela especulação imobiliária, carrega lembranças de um tempo em que a beleza do lugar era inquestionável. As reflexões de X sobre as mudanças nas relações à medida que envelhecem, culminam em momentos de melancolia e saudade, marcado pela lembrança do guarda 5, onde um homem rememora a morte de seu irmão, evocando a dualidade do luto e a continuidade da vida.

A história se desdobra em experiências de G e H na praia menos frequentada, Guarda 17, onde enfrentam um ambiente insalubre. Mesmo assim, a ousadia de nadar nessas águas questionáveis reflete uma busca silenciosa por intimidade, revelando como a busca por conexão pode superar as adversidades. Outro ponto alto da narrativa é a descrição de uma família que visita um balneário tranquilo, onde o pai, V, lida com a transição da filha Z para a adolescência. As preocupações que surgem com essa nova fase da vida de Z impõem a V uma reflexão sobre seu papel como pai e as novas dinâmicas familiares que se estabelecem, reafirmando como a percepção das relações muda com o tempo. Além dessas perspectivas, a obra também nos apresenta um momento tocante da infância, com uma criança que chora na beira da praia, e a luta de um homem que questiona suas aptidões como pai, mergulhando em uma onda de arrependimento e aversão ao compromisso que o cerca. Essas vozes, solitárias e interligadas, enriquecem a trama, trazendo à tona as inquietações que cada um carrega.

A obra prossegue com a inserção do conto ''o anjo exterminador'', que narra a vida de um marido ao lado de Suzanna,  em um mundo distópico. Eles moram em uma "Torre de Aço e Vidro" e transitam por um sistema de roldanas que traz para eles objetos e lixo. No entanto, o cenário é sombrio. Eles têm consciência da existência de "Cidadãos Miseráveis" que habitam as casas humildes, e a presença do "Anjo Exterminador" sugere uma sociedade rígida e opressora. Suzanna, sempre se preocupa com essas pessoas, e o marido tenta consolar sua preocupação, mesmo relutando em encarar a dureza da realidade. Além disso, a dupla enfrenta o mistério do desaparecimento de seu gato. Apesar das dificuldades e da inquietude que os cercam, o marido sente que a presença de Suzanna torna tudo mais leve e significativo.

O capítulo "Nico e Kira" oferece uma visão introspectiva sobre as dificuldades enfrentadas por um casal em meio a crises de emprego e os desafios do cotidiano. A narrativa começa com a demissão de Nico, um trabalhador que dedicou uma parte significativa de sua vida à fábrica de colchões, sendo substituído por máquinas mais modernas. A frustração e o desamparo que ele sente ao receber a notícia são palpáveis, especialmente no momento em que tenta esconder a demissão de sua esposa, Kira. Enquanto Nico se entrega à contemplação de sua nova realidade, Kira, em seu trabalho como manicure, também enfrenta suas próprias inseguranças e desafios. O contraste entre as profissões e suas respectivas demissões sugere que o mercado de trabalho é implacável e não discrimina. Kira tenta entender seu valor e lugar nesse novo cenário, refletindo sobre a hierarquia existente no salão de beleza onde trabalha e as dificuldades que vêm com a instabilidade de suas atividades.

A obra segue com outros contos de igual relevância, mostrando as habilidades de escrita imponentes apresentadas por Antônio Pokrywiecki, demonstrando uma habilidade ímpar em criar um espaço literário rico, onde a praia atua como um espelho da condição humana, evidenciando a complexidade das relações nos diferentes estágios da vida. Com uma prosa sensível e pensativa, o autor nos convida a refletir sobre o amor, a solidão, a passagem do tempo e o incessante desejo de conexão que define a experiência humana. Em sua totalidade, a obra é uma exploração profunda das nuances emocionais que permeiam a vida e as interações humanas, encerrando cada narrativa em uma leveza tocante e ao mesmo tempo dolorosa.

[RESENHA #987] Pesadelo tropical, de Marcos Vinícius Almeida

Em 1803, quatro mercenários são contratados pela Coroa Portuguesa para ir ao Mato Grosso em busca de uma aliança com os Guaicurus. Guiados por um gigante albino chamado Cigano, eles devem se unir aos indígenas cavaleiros para atacar a vila de párias construída pelo justiceiro Januário Garcia Leal, o Sete Orelhas, na Serra da Mantiqueira. O relato dessa peregrinação sangrenta é feito por um dos quatro mercenários, um escriba. No entanto, ela é apenas o começo de uma misteriosa trama que extrapola as páginas do próprio livro.

De um lado, uma perseguição sangrenta e sem misericórdia. De outro, a história de um homem escrevendo uma ficção baseada na caçada a Januário.

Faroeste barroco, Pesadelo Tropical não tem medo de explorar os limites do gênero. O primeiro romance de Marcos Vinícius Almeida incorpora elementos da fotografia, do ensaio, pastiche, citação e montagem numa forma híbrida e experimental.


RESENHA


O romance "Pesadelo Tropical", escrito por Marcos Vinícius Almeida, é uma obra que reflete a profundidade e a complexidade da literatura brasileira contemporânea. O autor, que também é jornalista e mestre em Literatura e Crítica Literária pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, traz consigo um vasto repertório de experiências e premiações literárias, destacando-se no III Prêmio UFES de Literatura em 2015, na categoria antologia, e no I Prêmio UFES de Literatura em 2010, na categoria contos.


Em "Pesadelo Tropical", Almeida mergulha em uma pesquisa profunda sobre o imaginário da violência no Sul de Minas Gerais nos séculos XVII e XIX. O livro, resultado de sua pesquisa no programa de pós-graduação em Literatura e Crítica Literária da PUC-SP, revela a capacidade do autor em explorar temas complexos e relevantes para a história do país.


Percebemos que a obra marca a estreia de Almeida no gênero do romance, após publicar o volume de contos "Paisagem Interior" (Penalux, 2017). O enredo de "Pesadelo Tropical" se passa em 1803 e acompanha um grupo de quatro mercenários liderados por um gigante albino chamado Cigano, que viajam em direção ao Mato Grosso com o objetivo de estabelecer uma aliança com os indígenas guaiacurus, após terem sido contratados pela Coroa Portuguesa. A história narra a vingança de um homem após seu irmão ter sido esfolado vivo.


A imersão histórica e a intensidade narrativa presentes na obra de Marcos Vinícius Almeida envolvem o leitor em uma atmosfera densa e sinistra, proporcionando uma experiência literária marcante. Essas características do livro despertam grande expectativa e interesse nos leitores, que já podem adquirir o romance em pré-venda no site da Aboio. Além disso, estão previstos eventos de lançamento em São Paulo e Minas Gerais, possibilitando ao público conhecer melhor a narrativa intrigante de "Pesadelo Tropical".


Com fotografias, obras de arte e recortes de mapas, o autor cria um mosaico que dialoga com cavaleiros barrocos que perambulam por um Brasil imerso no tempo e amaldiçoado por Deus. Esses elementos visuais complementam a narrativa, criando uma atmosfera ainda mais envolvente e única.


A obra é apresentada do ponto de vista de um dos quatro mercenários, que tem o papel de escriba do grupo. Essa escolha narrativa contribui para o mistério que envolve a trama, pois revela apenas o começo dessa história complexa e intrigante. O autor deixa pistas sutis ao longo do romance e convida o leitor a desvendar os segredos que se escondem além das páginas.


Além disso, "Pesadelo Tropical" traz personagens históricos importantes, como o infame Sete Orelhas, considerado um dos facínoras mais terríveis do interior brasileiro na época. A figura de Sete Orelhas, juntamente com as disputas de terras e a violência característica do período, adiciona camadas de tensão e drama à trama, tornando-a ainda mais impactante.


A escrita de Marcos Vinícius Almeida é rica em detalhes e carregada de simbolismo. Ele cria um cenário vívido e imersivo que transporta o leitor para uma época marcada pela opressão e pela luta pela sobrevivência. "Pesadelo Tropical" é uma obra que instiga, surpreende e provoca reflexões sobre as dinâmicas sociais e históricas do país.


Em suma, "Pesadelo Tropical" é uma obra literária que merece destaque. Com sua narrativa envolvente e complexa, o autor Marcos Vinícius Almeida presenteia os leitores com uma história única e impactante. Para aqueles que se interessam por tramas históricas e misteriosas, esta obra certamente se tornará uma leitura indispensável.


O autor

Marcos Vinícius Almeida é escritor, jornalista e mestre em Literatura e Crítica Literária (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo). Possui trabalhos publicados em revistas e jornais, como Ilustríssima, Suplemento Literário de Minas Gerais, Revista Cult. Foi um dos laureados no III Prêmio UFES de Literatura, em 2015, na categoria antologia e no I Prêmio UFES de Literatura, em 2010, na categoria contos. É autor do volume de contos Paisagem interior (Penalux, 2017). Pesadelo Tropical é seu primeiro romance.

[RESENHA #986] Sem os dentes da frente, André Balbo


SINOPSE

O desaparecimento dos objetos do apartamento de uma mulher, uma chuva misteriosa sobre um cemitério à beira da privatização, uma descoberta tardia em um orfanato de meninas, a luta pela sobrevivência de uma nova espécie, uma partida de dominó em Araraquara, o segredo de um casal de búfalos, os dias de um dragão na praça de uma pequena cidade, o testemunho de um anão de jardim, as relações entre divórcio, dentes e autoritarismo.

Esse apanhado serve como um desenho do caminho trilhado pelo novo livro de contos de André Balbo. Como escreve Cristhiano Aguiar na orelha, Sem os dentes da frente segue uma tradição insólita latino-americana, ficando, no campo das referências, entre um Julio Cortázar e uma Mariana Enriquez.

RESENHA

"Sem os dentes da frente" é um livro de contos escrito pelo autor paulista André Balbo. Esta obra é, sem dúvida, uma experiência literária diferente. Balbo é o tipo de autor que evoca acontecimentos simples de forma fantástica em um enredo extremamente desenvolvido em suas minúcias. Os contos elaborados pelo autor se mostram intensos e distintos de escritas do mesmo segmento. Analisar todos os contos sob uma ótica crítica requer que entendamos que cada conto possui um universo particular único e transformador. Balbo é conhecedor da alta literatura, da escrita cativante e dos enredos repletos de mistérios, com histórias construídas de forma envolvente e trabalhadas fora da noção do óbvio. Nota-se um empenho e um conhecimento extenso em literatura e produção literária.

O livro é marcado pelo encontro de personagens e momentos distintos que não possuem uma conexão direta, exceto, claro, por sua excentricidade. Com apenas 77 páginas, narra uma série de acontecimentos marcantes. Por exemplo, "Em casa vazia" narra a vida de uma mulher que perde constantemente objetos de sua casa e acaba dormindo no chão do lado de fora de seu apartamento. Outro exemplo é "Os desaparecidos", que narra o surgimento de uma nova espécie que reina entre os humanos e a transição entre aqueles que foram acometidos pouco a pouco da metamorfose. Esses enredos transformam-se em uma experiência de leitura única, não apenas pela satisfação da descrição meticulosamente escrita, mas também pela sua originalidade e proficiência para tal.

O conto homônimo ao título da obra fala sobre uma briga escolar entre dois garotos: Igor e Otávio. A obra narra as provocações feitas pelo valentão da escola, Leonardo, que sempre que pode, provoca Otávio, um garoto nerd, gordo e que acabara de passar pelo sofrimento do tratamento de um câncer. Após algumas provocações, Igor mostra-se, em primeira instância, um garoto que surge para defender Otávio de Leonardo. No entanto, sua moral é ferida ao ser confrontado por um comentário de Leonardo: "Você tem dois palitinhos de altura. E ai, gordão, você precisa desse anãozinho?" Otávio então sente-se instigado a enfrentar Leonardo, porém o mesmo se afasta e a briga se desenvolve entre Otávio e Igor. "Sem os dentes da frente" é como Igor fica ao ser socado no rosto várias vezes por Otávio.

A obra "Sem os dentes da frente" é uma leitura envolvente e cativante, que transporta o leitor para um universo particular de contos intensos e distintos. A escrita precisa de Balbo e sua habilidade em contar histórias de forma original e fora do comum é evidente em cada página. É uma obra que merece destaque na literatura contemporânea.

Compre o livro no site da editora Aboio:

O AUTOR

André Balbo nasceu em São Paulo em 1991. É tradutor e editor-fundador da Lavoura. Cursou Direito na USP, passou pela Folha de S.Paulo e foi professor autônomo de redação e literatura por 6 anos. Cursa Letras na UPM e, além do mercado literário, trabalha em uma editora de educação. Sua primeira tradução, o romance Agostino, de Alberto Moravia, será publicada pela Editora Aboio.

[RESENHA #985] Forte como a morte, de Otto Leopoldo Winck

Foto: Colagem digital 

Uma criança alçada a santa, um padre em crise com a própria fé e uma investigação sobre a doutrina de kenosis. Um tríptico narrado a várias vozes, o novo romance de Otto Leopoldo Winck pincela uma história a partir da manhã na qual Rosália Klossosky acorda com misteriosas manchas vermelhas em ambas as mãos.

Costurando passado e presente com ecos do futuro, o autor cria uma trama que continua atual apesar de ter sido escrita há quase duas décadas. A luta por terra e moradia, os conflitos religiosos e os dramas particulares dos personagens ainda têm a mesma relevância que tinham no começo do milênio. O Brasil de ontem não é tão diferente do Brasil de hoje, afinal.


RESENHA


Na zona rural do Paraná, vivia uma família simples de origem polonesa. A filha única, que havia acabado de entrar na puberdade, acorda subitamente com os estigmas da Paixão de Cristo. Rosália, assim chamada, é levada ao centro de uma acalorada polêmica: algumas pessoas acreditam que ela é uma santa, um instrumento nas mãos de Deus; enquanto outros a veem como uma fraude ou mera superstição.


Quando certa manhã Rosália Klossosky se levantou, depois de sonhos inquietos - que sonhos, meu Deus! -, percebeu que havia uma mancha levemente rosada na palma de cada mão.


Uma hora a mãe entrou com uma terrina de sopa de beterraba, e depois de depositar o vasilhame fumegante fumegante sobre a cômoda, puxou as cobertas para acordar a filha. Foi então que viu: Rosália sangrava, nas mãos e nos pés. O lençol, a camisola, o acolchoado de penas de ganso, tudo, tudo estava empapado; até no piso de pinho sem lustro se formava uma pequena poça vermelha (p.28)


Após o ocorrido, dona Florentina, mãe de Rosália, chamara o doutor José Idelfonso Gûnther para analisar a filha. O médico cético receitou uma dieta em beterraba, cenoura e repolho, seguido de muito repouso e compressas de água nas partes. O médico era cético, mas aconselhou aos pais da garota - Florentina e Boleslau - a buscar auxílio do padre da paroquia local, padre Estanislau. 


Eu não sou católico, vocês sabem, não acredito nessas coisas. Mas, penso que seria conveniente chamar o padre para dar uma olhada (p.34).


O padre, após relutar freneticamente, decide ir até Rosália. O padre então analisou as feridas e com quem traçava uma absoluta certeza, comparou as feridas no tórax de Rosália com as causadas por uma lança ao corpo de Jesus por um soldado romano. O soldado feriu-lhe um lado com a lança / eles olharão para aqueles que o transpassaram. (p.46)


Um longo período de tempo se passa e acontecem muitas transformações nas vidas das personagens. Rosália, agora uma mulher casada e mãe de três filhos, deixou para trás os estigmas que desapareceram. Ela se encontra em um acampamento de trabalhadores rurais sem-terra em uma fazenda ocupada, onde há uma tensão no ar devido a uma liminar de reintegração de posse impetrada por um juiz. A polícia pode aparecer a qualquer momento para cumprir o mandado. Durante a confusão causada pela ação policial, ocorre uma tragédia, testemunhada por Rosália e um padre que estava assessorando o acampamento.


A história é uma descrição da desilusão da vida do padre, que o narra freneticamente. A obra então contempla três períodos distintos na narrativa: Os estigmas de Rosália, a vida de Rosália anos após o ocorrido, e claro, a vida do padre Estanislau. A forma abordada pelo autor para trabalhar as linhas temporais e as narrativas é algo singular e explicitamente enriquecedor. Forte como a morte é, como seu nome propriamente anuncia, forte e imponente.



A narrativa da obra, elaborada em terceira pessoa, ecoa entre as vozes de diversos personagens que descrevem os acontecimentos que se desenvolvem sob forte tensão e suspense. A narrativa desenvolvida por Otto trabalha as nuances de diversos personagens ao passo que narra a vida, o crescimento e os demais acontecimentos que se entrelaçam com a vida de Rosália. A obra que possui um cunho filosófico e teológico forte, traz a tona a história das observações e vivências de um Padre que observa todo o desenvolvimento da vida de Rosália, logo, ela torna-se apenas uma peça para o desenvolvimento das especulações acerca do ocorrido e de sua vida adulta sem os estigmas, que, como parece, desaparecem por completo com a mesma proporção e rapidez com a qual surgiram a primeira vez.


O AUTOR

Doutor e mestre em Estudos Literários pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Otto Leopoldo Winck nasceu no Rio de Janeiro, capital. Depois de uma passagem por Porto Alegre, radicou-se em Curitiba. Em 2005 foi vencedor do prêmio da Academia de Letras da Bahia, com o romance Jaboc, publicado no ano seguinte pela editora Garamond. Em 2017 lançou pela Editora Appris o ensaio Minha pátria é minha língua: identidade e sistema literário na Galiza, resultado de sua pesquisa de doutorado, e no ano seguinte publicou um volume de versos, Cosmogonias, pela Kotter Editorial. Seu último romance, Que fim levaram todas as flores, saiu em 2019, numa parceria da Kotter com a Patuá. Leciona atualmente na PUCPR e no programa de pós-graduação stricto sensu da Uniandrade.

[RESENHA #979] Mogens, de Jens Peter Jacobsen

No final do século XIX, a Dinamarca viveu um período de intensa efervescência intelectual e literária, sendo que essa época foi marcada por influências significativas. Enquanto George Brandes proferia discursos sobre as principais correntes da literatura do século XIX, Henrik Ibsen questionava de maneira profunda e incisiva a teoria evolucionária e o darwinismo que encontravam eco na Inglaterra, do outro lado do Mar do Norte. Nesse cenário de conflitos e controvérsias entre o velho e o novo, teorias eram defendidas e atacadas com extrema violência. Entretanto, nesse contexto, Jens Peter Jacobsen se destacou como um artista singular, preocupado unicamente em ser um criador de beleza e um buscador da verdade.


As suas obras, repletas de cores vívidas e que jamais desbotam, mostram a paixão de Jacobsen pela forma e estilo, estampando-os suavemente, mas com força e intimidade, assemelhando-se ao toque singular de um violino ao interpretar a leitura da vida. Além disso, Jacobsen é muito mais do que um simples estilista; ele é preciso em sua observação e minucioso nos detalhes, revelando uma compreensão profunda e íntima do coração humano. Os seus personagens são construídos a partir de uma combinação entre experiência e imaginação, revelando como são moldados e modificados por fatores físicos, hereditários e ambientais.


Jacobsen acreditava que todo livro de verdadeiro valor deve incorporar a luta de uma ou mais pessoas contra tudo o que tenta obstruir sua existência única. Esse espírito essencial permeia toda a sua obra, sendo presente em personagens como Mogens. Nascido em 1847, em uma pequena cidade dinamarquesa, Jens Peter Jacobsen já demonstrava talento para a ciência desde jovem, mas acabou optando pela literatura após contrair tuberculose. O restante de sua vida foi vivido de maneira simples e corajosa, sendo marcada por uma devoção apaixonada à literatura e batalhas constantes contra problemas de saúde.

O seu método de trabalho era lento e meticuloso, evitando os círculos literários da capital para ter tempo de realizar a sua obra antes que o tempo lhe fosse tirado. Sob a influência de George Brandes, que o encorajou, Jacobsen publicou diversos romances. Embora de pequena quantidade, a sua contribuição para a literatura escandinava foi monumental, já que ele criou um novo método de abordagem literária e uma nova forma artística que influenciou diversos escritores desde então.


Mogens é uma obra de contos escrita pelo autor dinamarquês Jens Peter Jacobson, a obra marca a passagem do romantismo para o naturalismo. A escrita é marcada pela presença da descrição rica e detalhada do espaço ao qual o enredo se desenvolve, tendo suas descrições do tempo e do espaço em quase toda a obra ao qual os acontecimentos se discorrem. A princípio, a obra narra a vida de um homem, de nome Mogens, que está apreciando a natureza e a chuva, ele molha-se, canta e dança despretensiosamente enquanto é observado por uma pequena garotinha em um arbusto próximo, ele então observa seu cachecol preso e decide vê-la mais de perto enquanto seu rosto e corpo estão molhados pela água da chuva que cai. Ela assusta-se e corre desesperadamente entre a floresta e desaparece, ele, após percorrer um longo trajeto em busca da garota, decide adiar sua busca e cai na gargalhada rindo de todo acontecimento, que, em primeira análise, causa estranhamento no leitor não somente pela reação do homem, mas por sua implacável decisão de busca pela garota em meio à floresta. 


Fazia um calor sufocante, o ar tremulava e tudo ao redor guardava silêncio; as folhas dormitavam nas árvores, e nada se mexia além das joaninhas nas urtigas e das folhas murchas que se espalhavam pela grama [...] (p.6)


Tudo cintilava, luzia e chapinhava. Troncos, galhos, tudo brilhava de umidade, cada pequena gosta que caía na terra, na grama, na escada junto à cerca, no que quer que fosse, dividia-se e espalhava-se em mil pérolas delicadas [...] (p.7)


A história segue narrando o encontro do Magistrado do Cabo de Trafalgar e sua filha com Mogens. Ao caminharem até a porta da casa do guarda da floresta, Nikolai, a menina assustou-se pois viu nele o reconheceu nele o homem que cantarolava na floresta. Eles então decidem sair para velejar em seu barco, trocando breves conversas com a filha do magistrado.


“Mas poesia? Oehlenschlager, Schiller e os outros?”
“Oh, claro que os conheço; tínhamos uma estante cheia deles em casa, e a Srta. Holm —  — lia-os em voz alta depois do almoço e à noite; mas não posso dizer que me importei com eles; Eu não gosto de versos.
“Não gosta de versos? Você disse que sim, sua mãe não está mais viva?
“Não, meu pai também não.”
Ele disse isso com um tom um tanto taciturno e hostil, e a conversa foi interrompida por um momento e tornou possível ouvir claramente os muitos pequenos sons criados pelo movimento do barco na água. A garota quebrou o silêncio:
“Você gosta de pinturas?”


O conto segue entre os discursos proferidos por Kamilla e Mogens que se mostra cada vez menos interessado nos tópicos, pois suas vontades e desejos eram o oposto dos quais a Kamilla poderia prever, até mesmo seu gosto pela matéria e pela natureza era um ponto distinto em sua consciência. A obra também narra um relacionamento marcado por poucas palavras, mas com uma admiração latente que se forma entre os dois. Com o tempo, o relacionamento de ambos amadurece em admiração, fazendo-o criar coragem e pedi-la em namoro:

[...] Eu quero perguntar uma coisa à senhorita, mas antes prometa que não vai rir de mim [...] Aqui está a mesa e lá está a cerca. Se a senhorita não quiser ser minha noiva, eu vou sair correndo, pular com o cesto por cima da cerca e desaparecer. Um. (p. 26)

Kamilla continua - Dois. A expressão do rapaz é de pura palidez - eu quero, ela diz. A partir deste ponto a história se debruça sobre a relação de ambos, um acontecimento que remete ao luto e ao inesperado, ao encontro de uma jovem moça chamada Laura, ao destino e desatino entre o caminho de Mogens e uma moça de nome Tora.

Como o próprio período da obra propõe como estética e influência, a obra de Jacobsen é profundamente focada em eventos traumáticos - a criação longe do pai, a morte da mãe, a perda do primeiro amor, os momentos de fraqueza e reflexões dolorosas - como imaginar a morte de uma amante mesmo com ela viva - até mesmo seus devaneios e cânticos em meio ao nada na natureza. As descrições da natureza e dos arredores ocupam grande parte da narrativa, o que pode ser, para alguns, cansativo, mas para os apreciadores da boa arte de escrever e viver um clássico, esta característica é a primazia da felicidade do leitor, que permite que sintamos e nos conectemos de forma mais íntima com o autor e com sua vida.


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[RESENHA #977] Ossada Perpétua, de Anna Kuzminska

Livro de estreia de Anna Kuzminska, fotógrafa e autora fluminense, Ossada Perpétua tateia um tipo peculiar de luto. A ausência dita comportamentos, o passado está eivado nas entranhas do vivos, mas a existência segue um compasso de normalidade.

As personagens de Anna parecem sempre querer fugir da realidade (ou do sonho) por meio do falatório vazio, do silêncio transfigurado em nota musical, da recusa do conforto fraternal, e, às vezes, da arte.

O jogo que se trava entre os desejos e as crenças das personagens é confrontado pelo insólito de desenterrar um pai sem túmulo, ou pela aprendizagem dos limites e transgressões durante a infância.

Anna circula Deus e o amor, as memórias germinando desejos, o cotidiano da morte, o avesso da morte, a negação da morte, a recusa da morte.


RESENHA


O livro “Ossada Perpétua” da autora Anna Kuzminská é uma obra que representa uma escrita profunda, reflexiva e estimulante. Com uma narrativa fragmentada e poética, a autora constrói uma trama repleta de simbolismos e metáforas, explorando temas como a busca pelo sentido da existência e a complexa relação com a finitude.

A escrita de Kuzmin se caracteriza pelo caráter crítico, lidando com situações polêmicas que criam conflitos entre personagens e provocam reflexões sobre autoridade, moralidade e como cada pessoa lida com a morte. A relação dos filhos com o pai falecido e a figura da mãe como elemento assertivo central da família são aspectos que o livro enfatiza.

A profundidade das perguntas e a linguagem poética utilizada permitem ao leitor mergulhar no pensamento dos personagens. Trechos do diário de quarentena revelam uma introspecção intensa, a exploração de pensamentos sombrios e o impacto da solidão e da incerteza no estado emocional do narrador. A escrita de Kuzmin desperta um sentimento de identificação com as ambigüidades da condição humana.

Uma característica distintiva da escrita do autor é também a criação de imagens vivas e uma atmosfera envolvente. A descrição da figueira como elemento constante e imperturbável representa a resiliência e a presença constante da morte na vida de cada pessoa. Os vitrais da igreja, representando a história de Jesus, reforçam a abordagem da finitude e da morte como temas centrais da obra.

Comparada a autores consagrados como Karl Ove Knausgård e Elena Ferrante, a escrita de Kuzminsky se destaca pela honestidade, reflexividade e abordagem às complexidades das relações familiares. A autora traz sua voz distinta, explora questões existenciais e a relação interna entre vida e morte de forma original.


[RESENHA #976] Jiboia, de Cecília Garcia


Animalescos, os 16 contos de Cecília Garcia nessa coletânea misturam o fantástico, o cotidiano, passagens bíblicas e panteões de outras fés. Com doses de terror, as histórias de Jiboia nos mantêm alertas, saboreando cada linha com curiosidade e receio.

Jiboia são os bichos internos e externos que Cecília Garcia alimentou ao longo dos anos reunidos em um único livro-selva.Abrir estas páginas é se perder no coração pulsante de um labirinto de obsessões, paixões frustradas, loucuras e medos de toda sorte. Para Ana Rüsche, que assina a orelha desta edição, “os dezesseis contos de Cecília Garcia encaixam-se perfeitamente” ao abordar “personagens curiosos, como biólogas em selvas urbanas, cujas artes não se distinguem de magos, curandeiras e bruxas, e paisagens incomuns na literatura, como madeireiras ou um bunker de um pecuarista”.

RESENHA

Jibóia é, como descrito, um livro de contos animalescos. A obra de Cecília Garcia é um mistério como sua capa, seu enredo é meticulosamente escrito para nos entreter por horas sem fim. A obra é um emaranhado de contos variados em confusões internas e cotidianas. No primeiro conto, a mãe verde, a autora nos convida à experienciar a vida de uma mulher negra de cabelos ruivos dona de um salão de beleza, ela, que antes era devota de Iansã, se vê cristã. Vivendo entre a margem da marginalização e da pobreza, a autora descreve com maestria pratos quebrados, medo, terror e desconhecido. A personagem é resiliente, firme e morada contante de vibrações espirituais, que como narradas pelos filhos, demônios que a fazem subir, cambalear, saltar entre o chão e o lustre e falar palavras indecifráveis. O retrato construído entre os personagens é caótico e completamente único.

No segundo conto, cerol na galinha, narra um episódio de um garoto que decepa a cabeça de um motoqueiro enquanto brinca de pipa, ele não sente culpa no ato, mas reflete na similitude entre o corte do motoqueiro e o corte da cabeça de uma galinha, que, ainda sem a cabeça consegue andar. A ladeira jorrava sangue, menstruada e sem calcinha [...] depois do corpo retirado, o menino jurando nunca mais empinar pipa. (p.15 - grifos meus). O encontro cruel que o destino preparou entre o fim da inocência de um garoto que não compreende a morte e deseja no fundo de seu coração que o motorista se levante e saia andando como uma galinha, ainda que para morrer depois. Um conto visceral.

O conto, Jiboia, narra a vida de uma bióloga aposentada que deixou a floresta para morar no centro de São Paulo em um apartamento abarrotado de plantas e jiboias que descem do teto ao chão. Ela é solitária, mas gosta da vida. A narrativa ocorre em primeira e terceira pessoa de forma simultânea, narrando os pensamentos e episódios da moradora, bem como seu encontro com o boitatá que grava tudo em um gravador e escreve sua história toda em um caderno, que como ela diz, tem uma história que precisa ser contada como um furo, como as histórias das mulheres loucas e desacreditadas. Em síntese, um conto emblemático.


[RESENHA #975] Deus criou primeiro um tatu, de Yvonne Miller

Alemã de nascença, brasileira de alma, Yvonne Miller reúne nesta obra 50 crônicas e microcrônicas ambientadas em Aldeia dos Camarás, na Mata Atlântica pernambucana.

Com o olhar atento, carinhoso e não ingênuo à vida no Nordeste, Yvonne Miller pincela a realidade cotidiana com a graça e a delicadeza de uma cronista madura.

Tudo para Yvonne Miller é matéria fértil para uma crônica: o dia a dia no Bosque Águas de Aldeia, uma cobra enroladinha na árvore, as descobertas de Chico, “o cachorro mais boa-praça do condomínio”, a caranguejeira em cima da cama etc. Com bom humor, ela nos ensina a perceber a poesia possível do nosso entorno.

Leve e divertido sempre que pode, Deus criou primeiro um tatu também é crítico e político quando precisa.


RESENHA


Deus criou primeiro um tatu é um livro de crônicas da autora Yvonne Miller, publicado pela editora Aboio. A obra é um ensaio intrincado de dúvidas e processos políticos acerca da mudança. Miller narra, com muito bom humor, os aspectos que ignoramos na vida e na natureza, bem como nosso poder de perseverança [e resistência] em meio à mudança. O enredo se inicia com uma passagem da autora revelando um encontro com um pajé, já no prólogo, ele por si, aconselha Miller a desbravar a natureza para se reconectar consigo mesma, em outras palavras, se reencontrar. 

Na sequência, em partiu, a autora nos convida á refletir sobre a resistência humana acerca das mudanças. Ela menciona os pequenos gestos e momentos da vida que não carregamos ou apreciamos com tanto entusiasmo quanto outros. Aqui, ela fala de organizar livros, apreciar o conto dos pássaros, ajeitar a moradia, comemorar os ventos e até mesmo , o prazer de se reconectar através da nudez. Este enredo bem elaborado e construído já começa com suas entrelinhas provocantes, sobretudo, quando uma personagem indaga 'indo embora?', sinalizando o recomeço de uma nova vida, um novo ciclo.

A autora segue suas provocações. O enredo construído de forma que nos leva à pensar apenas nas descrições minuciosas das aventuras de uma nova residência esconde algo em suas linhas. A autora por diversas vezes nos faz refletir sobre os detalhes que passam despercebidos por nós no dia-a-dia,  como mastigando frutinhas agridoces (p.22); ou como admirar a paisagem à nossa volta: A paisagem à minha volta é tão linda que mal dá para acreditar, o sol de verão está aquecendo a minha alma, e estou recebendo uma massagem da cachoeira. O que mais eu poderia almejar? (p. 23)

A autora celebra a vida, as visitas da família, os animais de estimação, o ar puro e as florestas. Seu cântico poético em cada linha revela um talento e uma destreza para ressignificar o poder de uma observadora nata, uma observadora da vida. Os humanos e os animais se dividem em dois grupos: os que pastoreiam e os que se deixam pastorear (p.43), fazendo uma clara alusão à felicidade existente na liberdade daqueles que se deixam pastorear pela vida e pelos momentos. Já em 'eis a pergunta', ela nos leva à uma reflexão acerca do espaço e do uso que cultivamos dele: A vizinha nova já chegou chegando [...] mandou três funcionários para tirar tudo o que não fosse árvore do terreno junto ao nosso. [...] onde antes se alegrava com beija-flores, ora verdes, ora azuis, dançando entre as helicônias, agora se deparava com campo marrom [...] fiquei logo preocupada... (p.61), em uma referência da vizinha não cultivar os mesmos hábitos que ela em relação ao mundo e a natureza. Esta preocupação latente nos mostra o quão indelicado uma intervenção no espaço natural pode ocasionar em momentos de tristeza e dúvida para outros seres, animais ou não. E você, já refletiu sobre o uso do espaço hoje?

Em síntese, a obra de Yvonne Miller é doce, convidativa, alegre, política, efêmera, cativante e extremamente necessária. Ainda que seja um livro repleto de microcontos, a narrativa é, senão, um intricando poético de um ensaio de valoração da vida e da busca por conhecimento e descobertas. Um livro necessário.

[RESENHA #966] Ilustrações, de Jailton Moreira


RESENHA

Ilustrações é o primeiro livro de poemas de Jailton Moreira, um artista plástico, professor e curador que conheceu todo o tipo de arte em suas andanças. O livro é fruto de uma relação em que o escrito se submete ao visual, e não o contrário. São 29 poemas que respondem poeticamente e criticamente às experiências vividas pelo autor frente a determinados artistas e suas obras, como Piet Mondrian, Diego Velázquez e Richard Serra.

O livro é uma obra que desafia o leitor a se tornar observador e a ir conhecer por conta própria os trabalhos que inspiraram o autor a escrever. Cada poema é uma tentativa de ordenar as impressões, os sentimentos e as reflexões que as imagens provocam no autor, usando uma linguagem simples, direta e criativa. O autor não se limita a descrever ou elogiar as obras, mas também as questiona, as contraria e as reinventa.

Ilustrações é um livro que mostra a versatilidade e o talento de Jailton Moreira, que transita entre diferentes formas de expressão artística, e que convida o leitor a fazer o mesmo. É um livro que celebra a arte como uma forma de conhecimento, de comunicação e de transformação.

Como descrito no site oficial da obra, este é um convite à experimentação em que o autor se liga ao visual para dar vida as palavras, e não ao contrário. A obra é ilustrada ricamente com imagens que carregam um forte sentimentalismo histórico e simbolista que provoca leitor não somente uma onda reflexiva, mas também uma série de pensamentos acerca da historicidade e das propostas elencadas em seu enredo. 

A obra possui 131 páginas carregadas com 29 poemas e imagens que conversam entre si em sua completude.  A segunda poética do autor é dedicada à uma obra de Giotto (pintor e arquiteto italiano) intitulada legend of St Francis: 15. Sermon to the Birds, que é uma das 28 cenas da Lenda de São Francisco pintadas por Giotto di Bondone na Basílica de São Francisco de Assis, na Itália. A obra retrata um episódio famoso da vida de São Francisco, o santo padroeiro dos animais, que pregou um sermão aos pássaros, exortando-os a louvar a Deus por todas as bênçãos que Ele lhes concedeu. A obra é considerada um exemplo da arte gótica, que se caracteriza pelo uso de cores vivas, pela representação de figuras humanas e pela expressão de sentimentos e emoções. A obra também mostra a habilidade de Giotto em criar perspectiva, profundidade e movimento, usando elementos como a paisagem, as árvores e as nuvens.

A poesia é uma reflexão sobre a arte e a vida, sobre o passado e o presente, sobre o sagrado e o profano. O poeta usa metáforas e imagens que remetem à obra de Giotto, como o berço, a espiga, o óleo, o canto, os pássaros, o céu, o verde e a proa. Ele também faz referências à história de São Francisco, como o santo pobre, o mestre triste e o sonho romano. Ele compara o seu sonho com o de São Francisco, que deslizam na região da Úmbria, onde fica a cidade de Assis.

A poesia é uma forma de homenagear a obra de Giotto e a vida de São Francisco, mas também de questionar o seu significado e a sua atualidade. O poeta se pergunta se o berço da arte pode se transformar em um começo, se é possível superar o vício e a violência, se é possível lubrificar as arestas e colocar a engenharia em movimento, se é possível contar histórias de pássaros e homens famintos, se é possível ver o céu azul e o verde vivo, se é possível sonhar com a paz e a harmonia.

Já na poética guitarras de Picasso, o poema é uma reflexão sobre a arte e a música, sobre o caos e a harmonia, sobre o antigo e o novo. O poeta usa metáforas e imagens que remetem à obra de Picasso, como o berço, o mastro, o âncora, o barco, o casco, a boca, a guitarra, o silêncio e a pátina. Ele também faz referências a diferentes gêneros musicais, como sardanas, cumbias, baladas, fados e fandangos. Ele compara a música tradicional e popular com a música experimental e desconcertante que a obra de Picasso representa.

O poema é uma forma de homenagear a obra de Picasso e a sua inovação, mas também de questionar o seu sentido e a sua beleza. O poeta se pergunta se a guitarra quebrada pode ser consertada, se a música descontínua pode ser ouvida, se a sonora pandora pode reverberar.

Em síntese, podemos dizer que o autor consegue de forma magistral e prolífica inserir em suas reflexões históricas, sociais e urbanas um contexto além da imagem. Essa nova categoria descritiva é uma forma de expor a história e as linhas poéticas em forma de enredo de forma poética e rebuscada. Uma poesia complexa e repleta de nuances quem devem ser sentidas em sua totalidade. Uma obra magistral. 

[RESENHA #964] Ti amo – Hanne Ørstavik

Um câncer terminal levará seu marido dentro de um ano. Ele ignora a morte. E ela se volta à escrita na tentativa de preservar a própria força vital. Para a escritora Natalia Timerman, que assina a orelha do livro, Hanne Ørstavik escreve “na imbricação entre vida e literatura”. Um dos maiores nomes da literatura norueguesa contemporânea, Hanne Ørstavik estreia no Brasil com o encantador e contundente Ti Amo. A prosa comovente que a consagrou como uma autora aclamada em diversos países foi traduzida por Camilo Gomide, direta do norueguês.

RESENHA

Ti amo é um livro que mistura ficção e realidade, baseado na experiência da autora norueguesa Hanne Ørstavik, que perdeu o seu marido italiano para o câncer. O livro é um relato emocionante e íntimo de um amor que enfrenta a morte, a dor e o silêncio. O livro é escrito e ambientado nos primeiros meses de 2020, e seus temas de perda e sofrimento são especialmente adequados para um tempo de luto internacional.

O livro narra a história de uma narradora sem nome que cuida do seu marido, doente de câncer, nos últimos meses da sua vida. Ela examina os elementos da sua vida juntos: a mesa vietnamita cor-de-rosa onde eles comem suas refeições, cada um dos Anos Novos que eles compartilharam, suas amizades e suas trocas mais íntimas. Com tudo em mudança, ela busca as facetas que permanecerão.

O livro é uma homenagem ao legado do seu marido, que era um editor e tradutor italiano, que amava a arte, a música e a literatura. O livro também é uma reflexão sobre as questões existenciais, culturais e linguísticas que o casal enfrentou em sua relação. O que se pode encontrar em um olhar? O que se esconde em uma pintura ou por trás de um punhado de palavras repetidas? Essas são as perguntas que assombram a narradora, que tenta preservar a sua própria força vital através da escrita.

Ti amo é um livro que mostra a sensibilidade e a sinceridade da autora, que é uma das escritoras mais admiradas e premiadas da Noruega. A autora escreve com uma linguagem simples, direta e criativa, que se adapta aos ritmos da mente da narradora. Na tradução de Martin Aitken, a história de Ørstavik ganha vida.

A obra possui um enredo poético e chocante. A autora descreve em detalhes, e em primeira pessoa, o di-a-dia em companhia do marido após diagnóstico. Noites mal dormidas regradas à adesivos e comprimidos para dor, morfina e muita resiliência.

[...] Você está sentindo muita dor. Não podemos colocar mais adesivos?, eu digo. Tudo o que resta é uma pequena pilha de adesivos. E então colocamos os adesivos, dois de cinquenta, um de cada vez,  e depois de passar o dia todo deitado com dores, você finalmente adormece. (p.49)

[...] O que consta em seu boletim médico é que desde o final de outubro os marcadores dobraram a cada novo exame. Lendo em retrospecto, vejo que antes não estava assim, no ano em que você fez a quimio, depois da cirurgia, os valores oscilaram um pouco para cima e para baixo, mas não passaram de quatro mil. [...] No entanto, a dor fica mais forte a cada dia, a cada noite, e agora você está com esse inchaço. [...]

[...] você está deitado na cama e acabou de colocar trezentos miligramas debaixo da língua, mas logo eles vêm te buscar, precisam te preparar para a ressonância magnética mais tarde, tiram você da cama e do barato que acabou de entrar, nós acordamos às sete horas, antes das oito estávamos no táxi. (p.72).

Em síntese, a obra de Ørstavik é complexa, dolorida, repleta de gatilhos. É uma leitura rápida, mas que dura uma vida toda. Leia este livro de coração e alma abertos, ele não é apenas um enredo, mas a descrição de alguém que acabou de perder o seu amor. Um livro para se por embaixo do travesseiro e reler sempre que se sentir sem forças, pois ainda que a autora trabalhe saudade e luto o tempo todo...ela também trabalha força e superação, e é aqui que reside a força de sua escrita: na resiliência.

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