SINOPSE: O feijão e o sonho narra o relacionamento conflitante entre Campos Lara e sua esposa Maria Rosa, dois seres antagônicos, mas incrivelmente unidos. Ele, professor, escritor com seis livros publicados e intelectual, porém um alienado incapaz de ser um pai e marido comprometido em assumir as mínimas obrigações do dia a dia – moradia, alimentação, vestuário.
Maria Rosa, ao contrário, representa o senso prático da vida, o esteio para a família não desmoronar. Um inadaptado. Homem como ele não nascera para o casamento, para a vida do lar. Maria Rosa tinha razão, quase sempre. Ela era o Bom-Senso. Maria Rosa não era uma inimiga. Maria Rosa era o outro lado da vida. O lado em que não daria coisa nenhuma, em que ele sempre fracassaria. O duro. O difícil. O sem cadência nem rima. O do seu permanente naufrágio. Uma história humana e envolvente sobre a difícil arte de conviver.
RESENHA
"O Feijão e o Sonho" é um romance do autor brasileiro Orígenes Lessa, lançado em 1938. A história acompanha Campos Lara, um poeta imerso em seus sonhos literários, desconsiderando as realidades práticas da luta pela sobrevivência. Casado com Maria Rosa, o casal enfrenta um desajuste constante. A família depende de Chico Matraca, o chefe de Lara, que recebe um salário mensal bastante modesto.
"O Feijão e o Sonho", de Orígenes Lessa, é uma obra que retrata de forma sensível e profunda a complexidade das relações familiares e as dificuldades enfrentadas por um casal em meio à luta por sobrevivência e realização pessoal. A narrativa gira em torno de Maria Rosa, uma mulher que se vê sobrecarregada com as responsabilidades do lar e da educação dos filhos, e de Campos Lara, seu marido, um poeta em busca de reconhecimento e sucesso literário.
Maria Rosa é uma figura central na história, representando a força e a resiliência das mulheres que carregam o peso das obrigações familiares. A rotina dela é marcada por uma agitação constante: acorda cedo, prepara o café, cuida da casa e se desdobra para lidar com as travessuras das crianças. A tensão em seu relacionamento com Juca, como ela carinhosamente chama Campos Lara, é palpável. Ele, frequentemente alheio às dificuldades que ela enfrenta, embarca em suas ambições literárias, enquanto Maria Rosa se sente cada vez mais sobrecarregada. Sua frustração é evidente, e ela lamenta a falta de apoio do marido, que parece mais interessado em seus personagens fictícios do que nos desafios reais da vida familiar.
Os diálogos entre os personagens revelam o caos do dia a dia. As interações com as crianças são uma fonte de conflito, e Maria Rosa tenta impor disciplina em meio à indisciplina. Sua autoritariedade, no entanto, é acompanhada por uma sensação de impotência. Juca, por sua vez, embora bem-intencionado, não consegue contribuir efetivamente, o que apenas intensifica a irritação de Maria Rosa.
A narrativa também destaca a dualidade entre a vida doméstica de Maria Rosa e a vida profissional de Juca, que é professor. Enquanto ele tem paixão pela educação, enfrenta desafios com a falta de comprometimento dos alunos e a desorganização do ambiente escolar. Essa dicotomia entre a vida pessoal e profissional de ambos os personagens ilustra as dificuldades que enfrentam em suas respectivas esferas, revelando a luta diária das mulheres e as dinâmicas familiares complexas.
À medida que a história avança, a gravidez de Maria Rosa traz novas complicações emocionais e físicas. A pressão da maternidade e a solidão se tornam mais intensas, especialmente quando Lara se afasta ainda mais, mergulhado em suas criações literárias. A transformação de Maria Rosa, passando de uma mulher cheia de sonhos e esperanças para uma figura que enfrenta angústias e frustrações, é marcante. A relação entre eles se deteriora à medida que ela se sente isolada e desvalorizada, e a repulsão que começa a sentir por Juca reflete a crescente distância entre suas vidas.
A chegada de um novo filho traz um misto de alegria e novas responsabilidades. A felicidade pela família se expande é ofuscada pela realidade financeira e as dificuldades que persistem. Apesar do sucesso de Campos Lara como romancista, a vida familiar continua a ser uma luta diária. A tensão entre suas aspirações artísticas e as necessidades práticas da vida familiar se intensifica, levando a um ciclo de insatisfação e descontentamento que permeia a obra.
O romance, bem recebido pela crítica, oferece um vislumbre da glória momentânea de Lara, mas também destaca a fragilidade de suas conquistas. O dinheiro entra na casa, mas as dívidas continuam a se acumular, e Maria Rosa, que havia encontrado um certo alívio, logo se vê diante de novas preocupações. A relação entre eles é marcada por um desequilíbrio, com Campos Lara se distanciando cada vez mais das responsabilidades da paternidade e do casamento.
A obra explora temas como a luta por reconhecimento, a tensão entre sonho e realidade, e as dificuldades emocionais da maternidade. Campos Lara, diante de seu sucesso, reflete sobre sua identidade como poeta e suas limitações como provedor. Ele se questiona sobre o que realmente pode oferecer à sua família, enquanto a solidão e a frustração criativa o consomem. A narrativa culmina em um retrato da solidão do artista, que, apesar de alcançar a glória literária, se vê isolado e desiludido em sua vida pessoal.
Em última análise, "O Feijão e o Sonho" é uma reflexão poderosa sobre as escolhas que fazemos, as consequências dessas escolhas e a busca incessante por um equilíbrio entre os sonhos e as obrigações da vida cotidiana. A obra de Lessa é um convite à empatia, que nos leva a refletir sobre o papel da mulher, a natureza da ambição e a complexidade das relações humanas em um mundo em constante transformação.