O Segundo Sexo, de Simone de Beauvoir, é considerada uma obra fundamental na história do feminismo. Apesar de inicialmente negar sua afiliação a ideologias feministas, ela acabou reconhecendo isso quando O Segundo Sexo se tornou altamente influente no mundo do feminismo. Esta peça marcante teve um impacto profundo e abriu o caminho para as feministas da segunda onda, não apenas na América, mas também no Canadá, na Austrália e em todo o mundo. Embora alguns tenham citado Beauvoir dizendo “há uma exigência irracional que considero bastante estúpida porque me trancaria dentro de algum tipo de gueto feminino estúpido”, suas contribuições para o discurso feminista abriram portas para futuras gerações de mulheres que buscam igualdade . Os pioneiros da segunda onda, incluindo Kate Millett, Shulamith Firestone, Juliet Mitchell, Ann Oakley e Germaine Greer, todos devem muita gratidão a Simone De Beavoir - visitando a França em momentos cruciais (para consulta), traduzindo e dedicando obras inteiras baseadas no movimento; Betty Friedan, cujo livro 'The Feminine Mystique' foi aclamado como aquele que catalisou iniciativas feministas radicais baseadas nos EUA, creditou a leitura de 'O Segundo Sexo' durante o início dos anos 1950 - afirmando que ela achou a sabedoria escrita de De Bouvier totalmente inspiradora, 'algo de onde a análise original em relação à existência poderiam ser contribuídos, portanto, para objetivos políticos únicos desenvolvidos por este movimento dinâmico liderado tanto filosófica quanto intelectualmente sob a autoridade de DeBeauvoirs”.
No início dos anos 1970, Beauvoir alinhou-se com a Liga Francesa pelos Direitos da Mulher como forma de fazer campanha e lutar contra o sexismo na sociedade francesa. Além de seu impacto sobre os fundadores da segunda onda do feminismo, a influência de Beauvoir se estende a vários aspectos do feminismo, incluindo crítica literária, história, filosofia, teologia, crítica ao discurso científico e psicoterapia. movimento, um de seus objetivos era legalizar o aborto. Donna Haraway escreveu que "apesar de diferenças importantes, todos os significados feministas modernos de gênero têm raízes na afirmação de Simone de Beauvior de que 'ninguém nasce mulher [torna-se]'. Esta "mais famosa" frase feminista já escrita é ecoado no ensaio de Monique Wittig de 1981 intitulado One Is Not Born A Woman. Judith Butler leva esse conceito mais longe ao argumentar que a escolha de Beauvoir do verbo “tornar-se” sugere que o gênero é um processo que é constantemente renovado por meio de interação contínua. entre a cultura circundante e a escolha individual
Simone de Beauvoir: Vida e obra
[RESENHA #480] A Mulher desiludida, de Simone de Beauvoir
"A Mulher Desiludida" de Simone de Beauvoir é o primeiro livro da autora aqui neste espaço. Devo dizer que gostei desde o início, antes de entrar na história real. Li dois volumes de "O outro sexo" desse autor quando tinha vinte e poucos anos. Às vezes me pergunto se não é hora de reler esse livro que fez história nas décadas de 1960 e 1970.
"The Disappointed Woman" apresenta três estilos narrativos entre as histórias que Beauvoir experimentou. Diferentes modos ficcionais até certo ponto, tentando nos convencer a ver as três heroínas de diferentes ângulos. Quando a vida dessas três mulheres começa a desmoronar, tudo o que elas pensaram, pelo qual lutaram, se transforma em inimizade.
A primeira história "The Age of Discretion" é sobre uma escritora idosa que teme que a velhice limite sua criatividade na escrita. Ela não suporta que seu filho escolha um caminho diferente daquele que ela sempre pensou para ele, que é o caminho da universidade. O que se segue são lutas entre mãe e filho, esposa e marido, mãe e filha, os vários estados de espírito que podem fazer uma mulher se sentir traída ao se recusar a "ver" a verdade quando ela é apresentada. Em outras palavras, auto ilusão. E a velhice sublinha toda a história.
Em "O Monólogo", o estilo de Beauvoir assume tons amargos, as divagações de uma mulher rica que mora sozinha na véspera de Ano-Novo. Numa narrativa raivosa, implacável em relação às pessoas com quem convive e a quem acusa. Depois dos quarenta, a consciência do narrador muda quando descobrimos a terrível verdade. Apesar das situações difíceis descritas neste conto, a mudança no estilo da narrativa chama a atenção. É impressionante. Este é o resultado das reflexões noturnas de uma mãe privada dos cuidados com o filho. Uma mãe que deixa seu veneno sobre tudo e todos, que despeja ódio e vingança sobre seus parentes e seus filhos, que são suas próprias vítimas. É uma história intensa e fragmentada.
"Meu Deus! Mostre-me que existe um Senhor! Mostre-me que existe um céu e um inferno Eu andarei pelas ruas do céu com meu garotinho e minha querida filha E todos eles estarão se contorcendo nas chamas da inveja Eu assistirei eles assam e gemem eu vou rir As crianças vão rir comigo. Você me deve esta vingança, meu Deus. Eu peço que ela seja dada a mim." (página 82)
A terceira história é o título do livro "A Mulher Desiludida", escrito em forma de diário. Monique relata o declínio diário de seu casamento. Depois que o marido de vinte anos de casamento lhe conta que está tendo um caso com uma mulher mais jovem, o mundo de Monique vira literalmente de cabeça para baixo. Só um detalhe: na época em que Simone de Beauvoir escrevia essas histórias, as mulheres eram totalmente dependentes de seus maridos. Monique construiu sua vida em torno deste homem e sua vida está sofrendo com esta notícia dele. Toda a sua vida está ameaçada por esta notícia. Simone de Beauvoir escreve um relato honesto de algo que foi muito mais devastador em uma época em que as mulheres não conseguiam se sustentar financeiramente, principalmente uma mulher de meia-idade que não usufruía dos benefícios da juventude ao seu lado.
Ao lermos a história, vemos como essa mulher tenta manter um certo grau de normalidade com tudo o que está acontecendo. Simone de Beauvoir toca o coração da existência humana. Este tema é universal, em que os medos humanos, o envelhecimento, a perda, o desespero assumem algo de íntimo e pessoal. Escrito em primeira pessoa, como mencionado, a história consiste em uma série de diários de Monique, uma mulher de meia-idade cujo marido é médico trabalhador e cujas duas filhas adultas não moram mais em casa.
Quando Maurice, marido de Monique, sai de cena por completo, sentimos um lugar escuro e vazio. No quarto fechado de seu ex-marido, que eles compartilharam por tanto tempo, agora habita uma sensação de futuro solitário, que ela teme muito.
"A mulher decepcionada" de Simone de Beauvoir ainda é relevante, apesar da diferença de épocas. Uma história universal condensada em um livro maravilhoso. E merece um lugar de destaque na sua estante.
Resenha/Análise: O Segundo sexo, de Simone de Beauvoir
ISBN-10: 8520921957
Ano: 2016 / Páginas: 936
Idioma: português
Editora: Nova Fronteira
BEAUVOIR, Simone. O segundo sexo: fatos e mitos. 4 ed. São Paulo: Difusão.
Nascida na França em janeiro de 1908, Simone de Beauvoir foi figura importante na defesa da igualdade entre os sexos e uma das mais honradas filósofas existencialistas do século XX, com impacto inestimável no modo de pensar moderno. Filha de um casal contrastado – pai burguês e agnóstico e mãe católica defensora dos costumes –, Simone construiu sua trajetória de forma independente. Suas obras são íntimas e retratam de forma reveladora as experiências de sua vida e de seu tempo.
Dentre as suas obras, destaca-se o ensaio A velhice, onde sua crítica árdua e impetuosa sobre a atitude da sociedade para com os anciãos comove e acende a revolta, enquanto a biografia A cerimônia do adeus, traz o retrato apaixonado – de forma beauvoiriana – dos últimos dez anos do companheiro Jean-Paul Sartre, com quem viveu um relacionamento pouco-ortodoxo, mas que foi de suma importância e somente juntos conseguiram influenciar de forma resolutiva o pensamento da época.
Neste artigo, entretanto, falarei de O segundo sexo, obra de Beauvoir publicada em 1949 que analisou de forma profunda e concreta o papel da mulher na sociedade. Duramente criticado por pensadores da época, inclusive pelo Nobel de Literatura François Mauriac, que chegou a dizer que O segundo sexo “é um “manual de egoísmo erótico,” recheado de “ousadias pornográficas”; que não passa de “uma visão erótica do universo”, um manifesto de “egoísmo sexual”.”, o ensaio de Simone é tão importante e revelador quanto polêmico e controverso.
2 O SEGUNDO SEXO
A primeira vez que ouvi o nome de Simone de Beauvoir eu devia ter por volta de dez ou onze anos de idade. Tinha terminado minhas “tarefas de fim do almoço” e tinha ouvido de minha avó – imigrante portuguesa, casada há 60 anos –, quando perguntei se meu irmão não poderia lavar a louça naquele dia, que “trabalho de casa é coisa de mulher”.
Por quê?, eu me perguntei. Quem convencionou isso?, meus pais?, minha família? Fui criada para a louça enquanto meu irmão não?, eu nasci assim? Perguntei as mesmas coisas a minha mãe – formada em Psicologia e magistrada em Filosofia –, que prontamente me disse que não; não, ninguém havia convencionado que tarefas domésticas são de domínio exclusivamente feminino. Mas os costumes e o modo que minha avó havia sido criada diziam que os homens têm suas próprias tarefas – sair para trabalhar, trazer o dinheiro para as compras no fim do mês – e as mulheres têm as suas – cuidar dos filhos, da casa, do marido – e, consequentemente, essa era a ideia correta de pensar, para ela. Também falou de uma escritora, uma francesa, que pensou do mesmo jeito que eu. Que diz que, na verdade, a mulher e o homem nascem exatamente do mesmo jeito; são concebidos do mesmo modo e, na infância e até certa fase, são indivíduos com pensamentos idênticos.
É assim que Simone de Beauvoir introduz seu pensamento na primeira parte de O segundo sexo. Em Infância, alega que não há fator algum – seja biológico, psíquico ou econômico – que prove ou dê alguma razão para o papel que a mulher assume e sempre assumiu na sociedade. Instiga e me faz pensar se tudo que aprendi sobre “distinção de gêneros” não passa de algo produzido para manipular – para me fazer aceitar que não posso contestar minha posição como indivíduo do sexo feminino e simplesmente seguir em frente sem discussões.
Diz ainda na primeira parte que “têm elas [as crianças dos dois sexos] os mesmo interesses, os mesmo prazeres, [...] tiram das funções excretórias que lhe são comuns, as maiores satisfações; seu desenvolvimento genital é análogo; exploram o corpo com a mesma curiosidade e a mesma indiferença; do clitóris e do pênis tiram o mesmo prazer incerto [...]” além de afirmar que o primeiro alvo dos desejos sexuais primitivos das crianças (independente do sexo) é a mãe, colocando então que, até a chamada segunda infância, meninos e meninas não passam por conta da “diferença de sexos” e são, portanto, indivíduos idênticos também em hierarquia.
Quando Beauvoir menciona a robustez da menina durante a pré-adolescência, me identifico. Até os meus quatorze anos, sofri com a pressão psicológica exercida por mim mesma com a ideia de que eu não era feminina o suficiente – ao ponto de ser comparada ao meu irmão, cinco anos mais velho, em diversas ocasiões. Identificar minhas angústias como mulher nas páginas do ensaio de Simone foi importante para mim – tão importante que posso ousar dizer que penso, agora, de outra maneira.
Quanto à “feminilidade”, Beauvoir diz que tal coisa como “instinto feminino” não existe; é como a frase que introduz todo o ensaio: “Ninguém nasce mulher; torna-se mulher” – ou seja, é algo imposto à mulher pela sociedade. No entanto, a passividade que singulariza a “mulher feminina” é um aspecto que se amplifica nesta desde os primeiros anos. É um equívoco, todavia, dizer que é uma qualidade determinantemente biológica; Simone escreveu: “na verdade, é um destino que lhe é imposto por seus educadores e pela sociedade”. O leque para o macho é muito mais extenso em opções; as brincadeiras “de mão” são encorajadas, subir em árvores é permitido, incentiva-se a rudeza. Já com a fêmea há o conflito; é ensinada e educada para agradar e procurar agradar, deve ser um utensílio, “renunciar à sua autonomia”, recusam-lhe a liberdade que a reafirmaria como sujeito ativo, que a faria compreender e descobrir o mundo, que lhe permitiria manifestar os mesmos interesses, a mesma curiosidade e ousadia de um menino.
Vejo essa relação que Simone cria de liberdade versus costumes na segunda parte do ensaio; em A mulher casada, refleti, junto com a autora, sobre o papel da mulher na tradição – ou como gosto de chamar, instituição – do casamento. A primeira vez que li a passagem: “Em sua maioria, ainda hoje, as mulheres são casadas, ou o foram, ou se preparam para sê-lo, ou sofrem por não o ser”, me perguntei se já havia sofrido algum tipo de preconceito ou repressão por ter dito que não tenho o desejo de me casar em meus planos futuros, e vi que a resposta era sim.
Em sua análise do matrimônio, Simone de Beauvoir diz que a ascensão econômica da mulher, de certa forma, lhe garantiu certos “privilégios” dentro do casamento que antes não lhe eram certos; “a mulher não se acha mais confinada na sua função reprodutora: esta perdeu em grande parte seu caráter de servidão natural, apresenta-se como um encargo voluntariamente assumido”.
Já ao final da segunda parte, começa a se observar as condições para a libertação social da mulher; a autora diz que tal ato “só pode ser coletivo”, no entanto existem aquelas que “buscam solitariamente realizar sua salvação individual”, que “é este último esforço [...] da mulher encarcerada para converter sua prisão em céu de glória, sua servidão em liberdade soberana” que encontramos na narcisista, na amorosa e na mística. A narcisista, segundo Simone, é, na minha visão, aquela que busca se auto afirmar com frequência, pois nada ouviu sobre sua condição quando mais nova – como a própria autora conta de quando viu uma mulher jovem que “aproximava os lábios do espelho como que para beber a imagem e murmurava sorrindo: “Adorável, acho-me adorável”” em um banheiro de um café –, que procura sua representação na literatura, com personagens belas, brilhantes, e, na falta destes adjetivos, escolhe a personagem de vítima, a esposa incompreendida. E por quê? Porque “a narcisista é tão dependente quanto a hetaira. Se escapa ao domínio de um homem singular, é aceitando a tirania da opinião”, sua vaidade nunca é saciada e com o passar do tempo, mais procura por elogios e êxitos, acabando muitas vezes em um “delírio paranoico”.
A amorosa – capítulo que a autora inicia dizendo que “a palavra “amor” não tem em absoluto o mesmo sentido para um e outro sexo”, e, citando Gaia Ciência de Nietzsche, “o que a mulher entende por amor é bastante claro: não é apenas a dedicação, é um dom total de corpo e alma, sem restrição, sem nenhuma atenção para o que quer que seja. [...] Quanto ao homem, se ama uma mulher é esse amor que quer dela; [...] se houvesse homens que experimentassem também esse desejo de abandono total, por certo não seriam homens”. Simone afirma que o homem é incapaz de ser “um grande apaixonado”, que apenas querem a sua amante para “anexá-la”, “querem integrá-la em sua existência, e não afundar nela uma existência inteira”. Já para a mulher, o amor é doação total e irrestrita. A mulher amorosa se torna um mártir pela injustiça de amar tão incondicionalmente e não receber nada em retorno; que o que a mulher oferece com tanto fervor e dedicação ao homem, este não se esforça um mínimo para aceitar – “O homem não precisa da dedicação incondicional que reclama, nem do amor idólatra que lhe acaricia a vaidade; só os acolhe com a condição de não satisfazer as exigências que tais atitudes reciprocamente implicam”.
Em suma, a mulher amorosa é vulnerável e cada vez mais é mutilada por esse sentimento. Beauvoir resume seu pensamento na sentença: “No dia em que for possível à mulher amar em sua força, não em sua fraqueza, não para fugir de si mesma, mas para se encontrar, não para se demitir, mas para se afirmar, nesse dia o amor tornar-se-á para ela, como para o homem, fonte de vida e não perigo mortal”.
A mítica é aquela que quando dedica seu amor a um homem, “nele ela procura Deus: se as circunstâncias lhe proíbem o amor humano, se é desiludida ou exigente, é em Deus mesmo que ela escolherá adorar a divindade”. A mulher, segundo Simone, ao contrário do homem dedica-se ferrenhamente a tal divindade, pois não precisa senti-la nem tocá-la para acreditar. Muitas vezes, a mítica pensa ser a “eleita de Deus”, e acha carregar com ela a missão de pregar doutrinas incertas e, dessa forma, ao assumir este papel, multiplica sua personalidade. Em conclusão, Simone diz: “o fervor místico, como o amor e o próprio narcisismo, podem integrar-se em vidas ativas e independentes”, os esforços de salvação individual não tem nenhum domínio sobre o mundo; a liberdade da mulher continua mistificada e, segundo a autora, “só há uma maneira de realiza-la autenticamente: projetá-la mediante uma ação positiva na sociedade humana”
3 CONCLUSÃO